(Por Laura Gonçalves Sucena)

Bolachas, bolos, sucos de caixinha são alguns exemplos de alimentos que atraem as crianças e, assim, as guloseimas entram cada vez mais cedo no cardápio dos pequenos. O problema é que o abuso de açúcar desde cedo expõe a criança a perigos que podem se estender pela vida toda.

Pensando nisso, a Casa da Criança de Sousas começou a estudar como retirar o açúcar da alimentação das crianças. Baseada na recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS), com o novo guia com recomendações de consumo de açúcar para adultos e crianças e do Ministério da Saúde de não se oferecer açúcar às crianças menores de 2 anos de idade, a instituição cortou totalmente o ingrediente no berçário no ano passado. Já este ano, a medida se estendeu às outras turmas.

As pesquisas sobre o corte do açúcar foram muitas e desde o ano passado a criançada vem se adaptando a nova era da alimentação mais saudável. “Faz alguns anos que estamos diminuindo o açúcar da alimentação das crianças, mas no ano passado, com a intensificação dos nossos estudos a respeito dos malefícios do açúcar nas diferentes faixas etárias, achamos melhor não mais utilizá-lo na instituição. Ainda não foi possível zerar totalmente, pois ainda há o consumo de massas, bolachas doces, pães e bolo. Na festa de aniversariantes do mês usamos 5% da quantidade de açúcar sugerida na receita”, comentou Angela Caporali, vice-presidente da instituição.

Para a nutricionista Rosani Turra, especialista em nutrição funcional, o açúcar só deve fazer parte da alimentação, com muita moderação, a partir de 2 anos. “Isso seria o ideal. Naturalmente as crianças vão entrar em contato, porém isso não deve ser incentivado. Assim como o sal antes de 10 meses também não deve ser colocado na alimentação. Não podemos esquecer que até aos 7 anos de idade a criança está em formação inclusive de seus órgãos e metabolismo, é nessa fase que podemos modular estes genes, para um adulto mais saudável, inteligente e feliz”, comentou.

Segundo Adriana Silva, Analista de Projetos da Fundação FEAC, que acompanha o trabalho da instituição desde 2014, sempre houve preocupação da diretoria da instituição em oferecer uma alimentação mais saudável às crianças. “Conscientes de que o excesso de consumo de açúcar era prejudicial à saúde dos pequenos, o discurso da diretoria sempre foi pelo controle. Os adultos em geral não conseguiam perceber que o açúcar consumido no dia a dia não estava apenas no açúcar visível, aquele que enxergamos e que usamos para adoçar os líquidos, como leite e sucos, mas também embutidos em alimentos industrializados como pães, macarrão, fórmulas de leite em pó, bolachas, refrigerantes, entre outros. Na rotina diária, onde são oferecidas várias refeições ao dia, foi e está sendo bastante desafiador montar o cardápio, pois, às vezes, em apenas uma refeição a quantidade de açúcar pode extrapolar ao que é recomendado para o consumo diário das crianças”.

“Acredito que o olhar atento, o compromisso e a dedicação de toda equipe está contribuindo para o sucesso deste projeto, que é bastante inspirador e serve de referência para o trabalho com a primeira infância”, finalizou.

Parceria com as famílias

Um dos desafios da introdução da alimentação mais saudável foi a parceria com as famílias. Segundo a vice-presidente, logo no início do ano, já na primeira reunião com as famílias, o assunto zero açúcar foi o tema principal. “Informamos que iríamos começar com a retirada do açúcar da alimentação e explicamos sobre os malefícios do açúcar para as crianças até 2 anos. Solicitamos ajuda da família para esta retirada, pois iríamos, logo de início, zerar totalmente o açúcar do leite no café da manhã, retirando os achocolatados e servindo leite puro”, comentou.

“Para as crianças do berçário foi um trabalho mais tranquilo, porque as mães estavam introduzindo as mamadeiras. Já para os maiores, acostumados com o açúcar, o trabalho com as famílias ainda é mais lento. Apesar das crianças não sentirem falta do açúcar na instituição, as famílias de algumas crianças ainda não conseguiram absorver a continuidade do trabalho. Mas não vamos desistir, o assunto está em pauta e é nosso dever levantar esta bandeira”, informou Angela.

Hábitos alimentares

Os hábitos maternos determinam preferências alimentares na vida da criança e as preferências alimentares adquiridas na infância e mantidas na vida adulta são, em boa parte, um reflexo das escolhas dos cuidadores. Desta forma, é fundamental cuidar dos hábitos alimentares na infância, promovendo uma alimentação saudável.

“A alimentação dos pais tem influência na criança. Quando desde a gestação a mãe come adequadamente (frutas, vegetais, cereais sem corantes ou alimentos sem conservantes), o bebê nasce com memória de algo bom! E, quando começar a se alimentar, o correto é oferecer alimentos naturais porque não conhecendo os sabores, ele aceita frutas, verduras e legumes. Os adultos que conhecem os sabores e fazem escolhas. É importante também ficar atento aos exemplos passados para a criança. Não adianta os pais darem o brócolis e não comerem. Ou dar suco para a criança, sendo que o pai bebe refrigerante”, frisou a nutricionista.

Segundo Rosani é importante que a mãe tenha uma boa nutrição durante a gestação. “Assim a mãe poderá oferecer ao seu bebê nutrientes que evitem que a criança seja hiperativa, ou tenha deficiência na aprendizagem, o que é bem comum nos dias de hoje. Por isso é importante suplementar a gestante com vitaminas, minerais e ômega 3, para que ela tenha uma gestação saudável, sem risco de abortos, partos prematuros, eclampse e diabetes gestacional”, exemplificou a nutricionista.

Adequando o paladar

Sabendo que o sabor doce libera em nosso sistema nervoso central sensações de prazer, o que acaba criando dependência emocional a certos alimentos, a creche conversou com vários especialistas e nutricionistas para a adequação ao zero açúcar.
“Pesquisamos muito e sabemos que estudos apontam que crianças que consomem açúcar têm maior risco de desenvolver diabetes, obesidade, cáries dentárias, aumento de cálcio no sangue, aumento da necessidade do magnésio e vitamina B6.

Quando se ingere açúcar com estômago vazio o corpo libera grande quantidade de adrenalina que causa sintomas como tremores, ansiedade e excitação, algo que pode evoluir para cansaço, irritabilidade e birras. Inclusive, há estudos que apontam que o açúcar pode agravar sintomas da síndrome de déficit de atenção e hiperatividade. Tudo isso nos motivou a mudar a dieta da creche”, contou Angela.

Com isso, a Casa da Criança de Sousas, que também conta com auxílio de uma nutricionista da CEASA, aposta na frutose. “Nossos sucos são naturais e quando a fruta é ácida, o mesmo é adoçado com banana. O bolo de maçã e chocolate é adoçado usando 5% da medida de açúcar e usa-se chocolate com 40% de cacau. A cobertura de chantilly é batida sem açúcar e só é servido em dia de festa”, revelou.

E além do açúcar, o sal também está em baixa na instituição. A vice-presidente informa que as quantidades são mínimas e que a meta é diminuir cada vez mais.

“Como começamos este trabalho completo no início do ano letivo de 2019, ainda não temos dados estatísticos sobre os benefícios para as crianças, mas para o próximo ano queremos efetivar uma parceria não só com as famílias, mas também com o Centro de Saúde para realizarmos um acompanhamento preciso das crianças e coletar dados”, informou.
Na instituição, atualmente, as crianças aproveitam para continuar brincando e se divertindo. Na hora da alimentação, que inclui café da manhã, lanche, almoço, lanche da tarde e jantar, a aceitação dos alimentos sem açúcar e sal é muito bem-vinda!

Primeira Infância em Foco

A Casa da Criança de Sousas faz parte do Programa Primeira Infância em Foco, iniciativa da Fundação FEAC que investe em esforços para promover o desenvolvimento da primeira infância com objetivo de assegurar que todas as crianças tenham desenvolvimento adequado à sua faixa etária.
Saiba mais: https://www.feac.org.br/primeirainfanciaemfoco/