Conhecida como Constituição Cidadã, a Constituição Federal de 1988 estabeleceu, em seu artigo 5º, garantias fundamentais para todos os brasileiros. Mais de três décadas depois, os direitos assegurados pelo documento ainda estão longe de se tornarem realidade para toda a população. Pesquisas apontam o crescimento da desigualdade social no país, com patamares alarmantes de risco social e fome.

Não por acaso, o desafio social e econômico, que se ampliou com a pandemia de Covid-19, a garantia dos direitos humanos e a defesa da democracia nortearam o 12º congresso do Gife – Grupo de Instituições, Fundações e Empresas. O tema foi “Desafiando estruturas de desigualdade” e contou com a participação da FEAC.

Durante três dias, entre 12 e 14 de abril, o Memorial da América Latina, em São Paulo, foi palco de debates sobre assuntos que estão em pauta no terceiro setor, como o Investimento Social Privado, o ecossistema de impacto, inserção produtiva, participação da sociedade civil e fortalecimento da cultura de doação, filantropia e políticas públicas.

Apoiado pela Fundação FEAC, o congresso do Gife é um dos maiores encontros sobre Investimento Social Privado e Filantropia no Brasil e reúne lideranças do setor, dirigentes de Organizações da Sociedade Civil (OSC), acadêmicos, consultores e representantes do poder público para discutir o enfrentamento da desigualdade social no país.

FEAC busca apoiar o fortalecimento institucional das OSC

Neste ano, o superintendente socioeducativo da Fundação FEAC, Jair Resende, participou da mesa Filantropia comunitária: mobilização de atores diversos para a transformação, que debateu caminhos para desenvolver os territórios e estratégias para solucionar vulnerabilidades sociais.

“Precisamos mobilizar mais atores e fortalecer as organizações que estão na ponta do atendimento às populações mais vulneráveis”, enfatizou Resende, defendendo que, em todo projeto financiado, 15% devem ser destinados ao fortalecimento institucional das organizações locais. Esta é a forma como a FEAC vem trabalhando nos últimos anos, em parceria com OSC de Campinas, visando sempre a implementação e consolidação de políticas públicas e o fortalecimento do tecido social.

Historicamente, o chamado Investimento Social Privado está presente nos setores desassistidos pelo poder público por meio de parcerias com organizações e/ou governos. “O ISP possui uma capilaridade no país muito grande, que às vezes o próprio governo não tem. Então, esta rede, bem articulada com as políticas públicas, órgãos governamentais, esfera municipal, estadual e federal, pode contribuir muito para o desenvolvimento social”, afirma Jair Resende.

Na visão de Resende, trabalhando articulado a essa rede, “o poder público pode estar em muitos lugares sem precisar necessariamente criar toda uma nova estrutura, até porque existem muitas coincidências nas atuações”, explica. Por isso mesmo, um bom diálogo entre as instituições e as diversas instâncias de governo (municipal, estadual e federal) é estratégico. O congresso do Gife funcionou como uma pequena amostra desta articulação e seu potencial para gerar transformação social nos territórios. Apenas em 2020, dado mais recente divulgado pelo Censo Gife, o Investimento Social Privado mobilizou mais de R$ 5,3 bilhões.

O que é dignidade humana para você?

Uma pesquisa internacional, iniciada em 2018, investiga as diversas dimensões da pobreza, identificando as privações vivenciadas por famílias e o que elas entendem por “dignidade humana”. O estudo intitulado Dignidade humana, pobreza multidimensional e justiça social é resultado da parceria entre pesquisadores da Unicamp, da Universidade de Cardiff, no Reino Unido, e da Universidade Federal Fluminense (UFF), do Rio de Janeiro.

A garantia da dignidade humana está no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal brasileira e é um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito. A pesquisa busca identificar junto a pessoas de diversos grupos sociais o que cada um interpreta como necessidades básicas que devem estar garantidas.

De modo geral, não foi percebida diferença relevante entre os diferentes grupos. As opiniões dos mais pobres e dos não pobres sobre o que deve ser garantido a todas e todos e o que deve fazer parte da dignidade humana permitiram que os pesquisadores aprofundassem alguns conceitos que estão na Constituição.

Um dos responsáveis pelas pesquisas, Luis Renato Vedovato é professor da Faculdade de Ciências Aplicadas e do programa de Pós-graduação em Educação da Unicamp. “Nossa preocupação é saber o que faz parte do conceito de dignidade humana, ou pelo menos de seus contornos. Por exemplo, ter acesso a transporte público faz parte? Ter acesso à internet faz parte?”, indaga.

“Como a pesquisa busca identificar as necessidades socialmente percebidas, temos como ligar essas com o conteúdo da dignidade humana, permitindo ao judiciário decidir, com base em pesquisa empírica, o que representaria uma violação à dignidade humana”, conclui Vedovato.

Ele explica que a equipe realizou um diagnóstico identificando as necessidades socialmente percebidas, a partir das entrevistas, e depois, identificando as privações apontadas. “Com os resultados, é possível pensar conjuntamente, estado, sociedade civil e instituições privadas, para a construção de políticas públicas efetivas e sob medida para cada território com suas necessidades específicas”, diz.

 

Por Natália Rangel

Revista Narrativa Social 26: Cultura de Doação

Edição 26 – Cultura de Doação

 

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