Como as escolas podem construir ambientes mais democráticos e acolhedores para as crianças? A mostra Novo Olhar, da Fundação FEAC em parceria com o Núcleo de Políticas Públicas (Nepp), inspirou profissionais da educação infantil a pensarem em novas propostas pedagógicas, valorizando experiências para além dos currículos tradicionais. Aberto ao público, o evento foi realizado entre os dias 1 e 3 de dezembro, na Casa do Lago, na Unicamp.

A mostra é a última etapa do percurso formativo Novo Olhar, que ofereceu uma formação online para 33 instituições de educação infantil de Campinas, entre março e agosto de 2021. Ao todo, mais de 400 profissionais participaram da formação.

Além de exibir os trabalhos das crianças desenvolvidos durante esse período, o evento também reproduziu ambientes de aprendizagem para mostrar como os espaços físicos podem ser aproveitados pelos profissionais de educação infantil para estimular os pequenos.

“Ao longo da formação, já víamos as escolas aplicando o que estavam aprendendo, colocando as crianças como criadoras, e não apenas reproduzindo propostas dos professores. Outras pessoas precisavam ver isso”, conta Teresinha Klain, analista de projetos do Programa Primeira Infância em Foco, da FEAC.

Oito pesquisadores do Nepp convidaram as instituições de educação infantil a enviar um projeto para a mostra, feito pelas crianças. O resultado foi a exibição de materiais, como desenhos feitos com elementos da natureza – folhas, sementes, gravetos –, vasos de argila e mandalas desenhadas em caixas de pizza.

Explorando as linguagens

Cerca de 400 pessoas visitaram a mostra, incluindo profissionais da secretaria de educação de Campinas, mestrandos da Unicamp, professores de educação infantil e funcionários da prefeitura de Mococa, Rio das Pedras e Hortolândia.

Os visitantes tiveram a oportunidade de transitar por uma ampla sala dividida nos chamados “ateliês”: espaços de experimentação planejados para a pesquisa das crianças. Cada um representou uma área de conhecimento, por exemplo, a arte visual, a leitura, a escrita, a botânica e as ciências.

A exposição buscou contemplar as múltiplas linguagens da infância e mostrar como as escolas podem tornar seus espaços mais ricos para os alunos. “Nós criamos espaços de referência para que os profissionais pudessem olhar e imaginar os alunos neles.  A ideia foi encantar e inspirar”, explica Teresinha.

 

No ateliê de artes visuais, por exemplo, foram expostos potes de tinta guache, escalonados em mais de 120 cores, a fim de mostrar a riqueza dos tons. Ao lado da tinta, estavam papeis coloridos, telas e pinceis de diferentes formatos e textura.  

Porém, as escolas não precisam dispor de materiais complexos para formar seus próprios ateliês. No ateliê de escrita, a exposição de papeis de carta e penas provou que é possível inovar com simplicidade.  

“Quando a criança começa a se interessar pela caligrafia, escrever com pena é bem mais significativo do que abrir o livro de caligrafia e ficar fazendo cópias”, aponta Roberta Rocha Borges, pesquisadora do Nepp e coordenadora da mostra. 

Já no espaço da biblioteca, foi organizada uma estante com diversos livros infantis, em frente a um tapete com almofadas e plantas em volta, tornando o ambiente mais convidativo para os pequenos.  

A pesquisadora Roberta destaca que todo o mobiliário da mostra foi pensado para as crianças: móveis baixos e leves, com o objetivo de beneficiar o processo de aprendizagem. “Estamos levando outro conceito para as escolas, mais acolhedor e mais aconchegante”, explica. 

Os espaços das escolas

Outro destaque do evento foi a palestra “A poética dos espaços da educação infantil”, do Gandhy Piorski, artista plástico e pesquisador na área da cultura da infância. Ele analisou que os espaços físicos das escolas são fundamentais para materializar as propostas pedagógicas.

“Todo o desenvolvimento da criança se liga diretamente à sua percepção do mundo material, que inclui a organização dos ambientes, os tons das cores, as texturas e a vitalidade que esses ambientes carregam”, explica Gandhy, em entrevista à FEAC.

Ele analisa que uma mostra como a do Novo Olhar abre portas para melhorias na educação infantil. “É um encontro de máxima importância, pois possibilita que educadores e gestores compreendam, de forma prática, o que é um ambiente acolhedor. A própria estética do local já ajuda as crianças a se desenvolverem.”

Frutos do percurso formativo

Na mostra também estava presente Jeanne Camargo, coordenadora da Casa da Criança Meimei, creche de Campinas. A instituição exibiu diversos trabalhos de argila feitos pelas crianças.

Jeanne destaca que a creche proporcionou a visita dos educadores ao evento. “Para nós, ver exposto o material das crianças foi muito importante. Isso é uma valorização para os nossos profissionais.”

A produção das artes se originou durante o percurso formativo Novo Olhar, no qual Jeanne participou, junto à diretora e sete professores da Meimei. “Nós fizemos uma oficina de argila durante a formação que foi maravilhosa, ampliou nosso olhar sobre a riqueza do contato com a terra”, conta.

A formação também inspirou mudanças concretas nos espaços. “O ambiente é um terceiro educador. A partir da formação, nós começamos a ter toda uma preparação dos espaços para a criança poder brincar neles”, diz Jeanne.

Este ano, por exemplo, a creche organizou seu próprio ateliê de arte. Para as atividades, os educadores ampliaram o repertório de materiais que podem ser encontrados na natureza, como carvão, gravetos e sementes.

Para o ano que vem, a intenção da Meimei é seguir na reorganização dos espaços. A coordenadora conta que os profissionais da creche estão elaborando um projeto de pesquisa, fruto dos aprendizados que tiverem no Novo Olhar. A proposta do projeto – que será apresentado à FEAC –, é ampliar o trabalho com ateliê, oferecendo tanto formação continuada para a equipe pedagógica quanto mobiliário e material adequado para as experimentações plásticas das crianças.

Roberta, pesquisadora do Nepp, espera que a mostra consiga inspirar outras instituições de educação infantil a seguir o mesmo caminho. “Foi uma experiência prática, para que elas possam levar os aprendizados para dentro das escolas”, conclui.

Novo Olhar para além de Campinas  

O percurso formativo do Novo Olhar está expandindo fronteiras: o Instituto Arcor, parceiro da FEAC, possui sua matriz em Rio das Pedras e inspirou as políticas públicas do município com o projeto. 

 Em agosto de 2021, a Secretaria Municipal de Educação começou a implementar o percurso nas nove escolas municipais de educação infantil. 

 Os grupos de estudos, que estão sendo ministrados pelo Nepp, serão concluídos no primeiro semestre de 2022. “É a primeira vez que uma metodologia da FEAC é multiplicada fora de Campinas”, comemora Teresinha Klain.  

Por Laíza Castanhari