Projeto realizará gratuitamente adaptação e manutenção de cadeiras de rodas para toda população

(Por Ariany Ferraz)

Com 63 mil pessoas com algum tipo de deficiência motora, Campinas disponibilizou cerca de 400 cadeiras de rodas e 98 meios auxiliares de locomoção, no período de um ano, através do Centro de Referência em Reabilitação (CRR) da Prefeitura Municipal, responsável pela dispensação dos meios auxiliares de locomoção pelo SUS. Porém, a fila de espera para adquirir as órteses, próteses e meios auxiliares de locomoção tem em média 800 pessoas que levam cerca de dois anos para receber uma cadeira de rodas. Com o objetivo de reduzir esse prazo, a Casa da Criança Paralítica (CCP) de Campinas e a Fundação FEAC criaram, em parceria, a ‘Oficina Locomover’. O projeto que visa realizar a manutenção e adaptação de cadeiras de rodas de forma gratuita foi lançado oficialmente neste início de setembro, abrindo as portas para toda a população de Campinas.

Serviço inédito no município, a Oficina Locomover estimar realizar a manutenção e adaptação de, no mínimo, 200 cadeiras anualmente, além de promover reparos de outros meios auxiliares de locomoção, como bengalas, muletas, andadores e afins. Um projeto que integra o Programa Mobilização para Autonomia (MOB) da Fundação FEAC, que financiou R$ 300 mil para a reforma do espaço físico, compra de equipamentos, insumos, capacitação e manutenção dos profissionais da equipe. “É mais um grande passo para nossa cidade! A Fundação Feac inova mais uma vez com uma ação construída em parceria”, comentou Flávio Eduardo Lopes, vice-presidente da área Socioeducativa da Diretoria Executiva da FEAC.

“A relevância do projeto vem do fato de não existir no município um serviço que pudesse dar vazão a demanda de manutenção e adaptação dos meios de locomoção. Isso tem um impacto muito grande na qualidade de vida dessas pessoas e também contribui junto a todos os outros investimentos que são realizados para garantir a eliminação de barreiras e a efetiva inclusão da pessoa com deficiência na sociedade”, avaliou Leandro Pinheiro, Superintendente Socioeducativo da Fundação FEAC.

“Há uma carência muito grande nesse segmento. O que nós observamos é que os fabricantes não têm uma estrutura de manutenção e transferem essa tarefa para as famílias, que não têm condições de assumir”, esclareceu Valdir José de Oliveira, diretor financeiro da CCP. “Geralmente era comprada uma cadeira, que com o tempo ia se desgastando. E não tinha um lugar que pudesse fazer a manutenção e adaptação, a não ser que a pessoa tivesse condições financeiras de gastar. Porém, a maior parte desse público é de baixa renda”, reiterou Maria Delta Ramos, Diretora Social, Coordenadora pedagógica e de voluntários da CCP.

No evento de inauguração da Oficina estiveram presentes usuários atendidos pela instituição, imprensa local, além de entidades como Centro de Apoio e Integração do Surdocego Múltiplo Deficiente (CAIS), APAE Campinas e Guardinha (Associação de Educação do Homem de Amanhã), buscando fortalecer a atuação em rede, contribuindo para encaminhamentos de novas demandas para o projeto.

Daniela Pereira, mãe de Beatriz Araújo, 7 anos, contou que esperou dois anos para conseguir a cadeira da filha e que para fazer a manutenção tinha que pagar, além de percorrer uma distância grande até o local. “É bem difícil esse acesso para fazer adaptações. Além de ser difícil, tinha que deixar a criança em casa para levar a cadeira até o local. Aqui na Casa a gente tem todo  suporte e, principalmente, vai ser gratuito”, observou Daniela.

“Demora de seis meses a um ano para conseguir uma cadeira e existem mães que estão esperando há quase dois! Essa oficina é maravilhosa, uma conquista para todos, pois vai ajudar demais!”, expressou contente Juliana Silva, mãe da pequena Sofia, 4 anos. Na primeira adaptação ela conseguiu a cadeira graças a doação. Há dois anos e meio a filha está com a cadeira inadequada, que já deveria ter sido trocada e adaptada de acordo com indicações da fisioterapeuta. Sobre manutenção no equipamento, ela ainda conta que nunca fez e já está com o prazo vencido.

“Já precisei adaptar minha cadeira e por não ter um serviço assim eu paguei bem caro. Não é todo local que tem a adaptação da cadeira, nem as peças disponíveis. Esse projeto vai ajudar bastante”, destacou a jovem Juliana Pinheiro, 21 anos. Ela conta também que já teve que usar a cadeira sem ajustes necessários, o que causou muito desconforto.

Oficina Locomover: soluções para mobilidade

“Geralmente tem que fazer mais esforço e há dificuldade de acesso no dia a dia por causa da cadeira de rodas sem os devidos cuidados. São trabalhos simples, mas que melhoram muito o dia a dia da pessoa com deficiência”, enfatizou Armando Suazo, coordenador da Locomover. Ao encontrar muitas dificuldades de acessibilidade nas vias públicas e meios de transportes, as cadeiras de rodas sofrem desgaste e precisam de manutenção de qualidade para o pleno funcionamento.

De acordo com Regiane Fayan, líder do programa MOB, uma manutenção adequada garante a qualidade no uso da tecnologia e aumento da sobrevida do equipamento. “Sabendo que parte dessa população é de baixa renda e que não existe um espaço gratuito para esse tipo de atendimento, as pessoas não tinham o que fazer, ou recorriam as bicicletarias ou ficavam sem o equipamento”, pontuou. Já em relação a adaptação, ela aponta que muitas pessoas, principalmente crianças, acabam utilizando a cadeira de rodas sem as adaptações necessárias ao seu corpo.

Armando explica que o serviço aumenta a vida útil do equipamento com os cuidados de limpeza, reparos básicos, reposição de peças, lubrificação, adequações das partes e calibragem dos pneus. Nas rodas, por exemplo, existe o alinhamento ou, dependendo da necessidade, a cambagem, que é o ângulo de inclinação interno e externo das rodas a fim de dar estabilidade. “É preciso entender o usuário, se ele é mais caseiro ou se é mais ativo, se pratica esportes, por exemplo, e ver como a cadeira se adequa à vida dele para proporcionar qualidade de vida e de saúde”, enfatizou.

Para que o projeto pudesse acontecer, a equipe passou por capacitações com a Rede de Reabilitação Lucy Montoro em São Paulo, capital. O trabalho é multidisciplinar e conta com a orientação dos profissionais de saúde, como fisioterapeutas, que indicam quais as necessidades de cada paciente. “Às vezes recebemos usuários com as pernas mais longas do que a cadeira, então é preciso ajustar para que não prejudique a saúde, com adequação no apoio de pé e recuo do assento para correção postural, por exemplo”, observou Armando.

“O trabalho do fisioterapeuta nas adaptações assistivas visa a prescrição adequada da cadeira de rodas para melhora da independência/ mobilidade, segurança, participação social do usuário, assim como conforto, alívio de pressão, suporte corporal, alinhamento e ajustes posturais para promoção das funções vitais”, avaliou Lilian Robbi, coordenadora técnica da Casa da Criança Paralítica. Ela explica que uma cadeira de rodas inadequada acarreta em danos ao paciente, levando a uma má postura, deformidades e podendo prejudicar a respiração, nutrição pela dificuldade de deglutição, alteração no sistema circulatório e consequentes dores.

Para que o processo de adaptação aconteça é realizada uma avaliação criteriosa pelo profissional de saúde, observando características específicas e individuais desde o biótipo físico, situação postural, capacidades funcionais e atividades de vida diária com a cadeira. Assim são identificadas as necessidades de utilização de alguns acessórios como cinto de segurança, apoio dos pés, abdutor de membros inferiores, encosto, mesa de apoio, apoios laterais para tronco, apoio de cabeça, bloqueadores de joelhos, protetor sacral, entre outros.

O coordenador também conta que recebem muitos equipamentos que o próprios usuários modificam em casa, utilizando ferramentas impróprias, que acabam prejudicando a estrutura do equipamento e que a equipe tenta corrigir, se possível.

Já foram reformadas 38 cadeiras de rodas do acervo da Casa, para viabilizar a iniciativa. O local, onde antes funcionava o bazar da entidade, oferece um estrutura completa e organizada para atender a população. Qualquer pessoa do município pode solicitar os serviços. A previsão é que no período de um ano a Locomover funcione gratuitamente. Futuramente, poderão ser feitas cobranças, gerando renda para sustentabilidade e manutenção da Oficina. Depois das cadeiras de rodas, em uma segunda fase, será a vez de trabalhar também com os meios auxiliares de locomoção, com a manufatura de órteses, e depois próteses, na última fase.

“Também pretendemos apresentar o projeto para Secretaria Municipal de Saúde para que realize uma parceria por meio do SUS, no financiamento do serviço de adaptação”, revelou Regiane sobre a intenção de ampliar o projeto.

Programa MOB

O Programa Mobilização para Autonomia (MOB) é uma iniciativa da Fundação FEAC que investe em soluções com o objetivo de assegurar a inclusão efetiva das pessoas com deficiência. Se dedica a romper barreiras para que as pessoas com deficiência possam participar da sociedade e exercer plenamente seus direitos.

Informações:  (19) 2127-7230

[email protected]

www.ccp.org.br