(Por Laura Gonçalves Sucena)

O isolamento social imposto pela pandemia do coronavírus (Covid-19) pode provocar um aumento nos casos de violência, tanto contra mulheres, quanto a crianças e adolescentes. De acordo com o relatório divulgado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, os atendimentos da Polícia Militar a mulheres vítimas de violência aumentaram 44,9% no estado de São Paulo, na comparação de março de 2019 e março de 2020.

Segundo a líder do programa Enfrentamento a Violências da Fundação FEAC, Natália Valente, o isolamento social adotado para prevenir a contaminação pelo coronavírus pode trazer impactos no aumento de casos de  violência doméstica. Apesar de Campinas ainda não ter registrado esse aumento nos números de violência, é preciso ficar atento às ocorrências durante o período da pandemia, motivado, sobretudo, pelo fato de vítima e agressor passarem a conviver ininterruptamente. 

Natália afirma que é preciso que as vítimas  saibam onde encontrar ajuda nesse período crítico, especialmente por estarem distantes de redes de apoio, uma vez que muitos serviços estão funcionando remotamente. “É fundamental que possamos divulgar amplamente e, principalmente nesse período, intensificar a informação sobre os canais de denúncia, redes de apoio e como acessá-las, tanto para que as vítimas, tanto para que a sociedade em geral, cumprindo seu papel protetivo, possam ter a segurança de denunciar os casos”, falou.

Até agora, Campinas não está nas estatísticas de aumento de casos de violências, porém isso não significa que os casos deixaram de acontecer. “É preciso lembrar que nesse período, provavelmente,  agressor e vítima devem estar mais próximos, levando em consideração que a maior parte dos casos de violência, acontecem dentro de casa” comentou Natália. 

Assim sendo, o município vem atuando de forma a divulgar os canais de denúncia e de alertar sobre possíveis situações desse tipo.

De acordo com informação do Centro de Referência e Apoio à Mulher (Ceamo), da Secretaria Municipal de Assistência Social, Pessoa com Deficiência e Direitos Humanos (SMASDH), a violência contra a mulher não aumentou.  Porém o órgão vem divulgando formas de acesso ao serviço e realizando o atendimento presencial quando necessário.

Segundo a coordenadora do Centro, Elza Frattini Montali, houve inclusive uma queda nas notificações de violência contra a mulher. “Tanto em abrigos quanto em delegacias podemos constatar que a queda nos casos de violências é significativa.  Mesmo assim estamos mobilizando a sociedade para que, em caso de situações de violência, as pessoas possam se apoiar, mesmo que seja indicando quais medidas podem ser tomadas”, explicou.

Os abrigos de Campinas também não registraram novos acolhimentos no mês de abril. “Isso mostra que houve uma queda nas notificações de violência. O abrigo é o primeiro lugar que as mulheres procuram através de delegacias quando estão em situação grave de violência”, garantiu a coordenadora.

A situação é semelhante com relação aos casos de violência contra crianças e adolescentes. Segundo o conselheiro tutelar da região Noroeste, Airton Pereira Junior, não houve denúncias no período de isolamento. Porém, o conselheiro afirma que é muito provável que à medida que as coisas forem voltando ao normal, os casos apareçam.

O impacto econômico da pandemia também pode ser um facilitador para deixar um parceiro ou familiar mais violento. “Atualmente as pessoas estão preocupadas em sobreviver. Muitas famílias estão em situações de alta vulnerabilidade, e o fato é que onde existe fome, existe violência. Acredito que teremos um aumento significativo de situações de violência”, admitiu o conselheiro.

Algumas Organizações da Sociedade Civil (OSC) de Campinas também estão atentas aos casos de violências, mesmo sem observar um aumento dos casos durante a pandemia. Viviane Reis, gerente socioeducativa do CPTI informa que nesse período, a entidade identificou apenas casos isolados de violência contra mulheres, crianças e idosos. A mesma situação vem sendo sentida pelo CRAMI.

“A temática da violência não tem sido apresentada durante os atendimentos via telefone, devido a necessidade prioritária de informações sobre os benefícios emergenciais. O CPTI tem procurado apoiar essas situações, no enfrentamento direto dos problemas sociais emergenciais, acolhendo as famílias que em geral tem demonstrado inseguranças e preocupações em relação às dificuldades do momento atual”, contou Viviane.  

Preocupação

Com o objetivo de orientar governos, a ONU Mulheres publicou um estudo sobre as dimensões de gênero na resposta ao novo coronavírus na América Latina. Nele, a organização ressalta que as mulheres continuam sendo as mais afetadas pelo trabalho não-remunerado, principalmente em tempos de crise.

O documento faz uma série de recomendações, incluindo garantir a continuidade dos serviços essenciais para mulheres e meninas em situação de violência. O documento diz que em um contexto de crise e emergência, os riscos de violência doméstica contra mulheres e meninas são maiores devido ao aumento das tensões em casa, em especial, devido à situação financeira.

No âmbito nacional, o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) lançou o documento “Recomendações do Conanda para a proteção integral a crianças e adolescentes durante a pandemia do Covid-19”. As 18 orientações são relacionadas  à intensificação da proteção integral de crianças e adolescentes – devido a sua condição peculiar de desenvolvimento, com proteção integral e na defesa do melhor interesse destes.

O Conanda considera que é imprescindível que as três esferas de governo elaborem Planos de Contingência visando conter a disseminação do novo coronavírus e que toda medida adotada deve ter a perspectiva de proteção global dos direitos humanos de crianças e adolescentes e da absoluta prioridade de garantia desses direitos – utilizando o máximo de recursos disponíveis para a efetivação de políticas sociais públicas que permitam as garantias de condições dignas de existência e a promoção de seu desenvolvimento integral. 

Canais de denúncia 

Em Campinas as denúncias de violência podem ser feitas por diversos canais:

Violência contra mulheres:

153 – Guarda Municipal (emergência)

180 – Central de Atendimento à Mulher (orientação)

0800.773.4340 – Defensoria Pública (denúncia)

(19) 983265389 – CEAMO – (orientação)

Violência contra crianças e adolescentes

100 – Direitos Humanos (denúncia)

0800 770 1085 – Conselho Tutelar (denúncia)