Falar sobre temas sensíveis nunca é fácil. No caso de situações de violência com crianças e adolescentes, então, este cuidado é redobrado. É possível falar sobre violência sem perpetuá-la? Existe um jeito de trabalhar essa questão sem revitimizar, criar traumas e despertar gatilhos?
É nesse contexto que surge o Projeto Novo Amanhecer, realizado pelo Centro Promocional Tia Ileide (CPTI) em parceria com a Fundação FEAC, no município de Campinas. Ele é fruto de uma demanda do serviço de proteção especial de média complexidade – que tem como foco atendimento a famílias e pessoas com direitos violados, mas cujos vínculos familiares não foram rompidos. A iniciativa propõe uma metodologia inovadora para abordar os tipos de violência aos quais crianças e adolescentes estão sujeitos, com a oferta de seis diferentes jogos e de uma oficina, chamada de oito sentidos.
“O projeto Novo Amanhecer nessa nova edição traz como objetivo instrumentalizar os profissionais da rede de atendimento para um trabalho na prevenção, abordando temas como estruturas sociais, autoproteção e na proteção, acolhida e encaminhamento de casos. Essas tecnologias deverão incorporar o cotidiano dos profissionais mesmo após o projeto se encerrar, o que faz do projeto inovador, trazendo conteúdos práticos e reaplicáveis nos diferentes contextos de atendimento”, reforça Natália Valente, especialista em violências da Fundação FEAC.
As atividades são realizadas com crianças de 11 e 12 anos e uma equipe composta por educador, psicólogo e assistente social. “A gente percebia que, para além do trabalho com a superação dessas situações de violência, era necessário também conscientizar e informar as próprias crianças, dentro de uma linguagem que fosse acessível a elas”, conta o coordenador do projeto, Thiago Lusvardi.
Conheça os jogos utilizados nas dinâmicas
Alguns jogos foram adaptados para o desenvolvimento das dinâmicas, que buscam informar e ressignificar os traumas sofridos. São eles:
Jogo da memória – Segue as regras tradicionais. O jogador tem de encontrar duas figuras que combinem entre si. Com a diferença que as cartas trazem informações sobre diferentes tipos de violências. Após a dinâmica, uma roda de diálogo desempenha papel essencial nesse processo de identificação, acolhimento e busca por ajuda.
Quem sou eu?: Trabalha os estereótipos. O participante precisa escolher palavras para definir a figura que tirou na carta, relacionada a questões raciais, de gênero, LGBTfobia, capitalismo e patriarcado.
Escutando vozes – É preciso indicar qual dos personagens sofreu ou foi autor de violência e por qual razão, o que faz com que o jogador recorra a prejulgamentos para justificar seu palpite. Os estereótipos são problematizados a fim de gerar reflexão.
Linha do tempo – Jogo estruturado com gênero, raça e direitos da criança e do adolescente. No tabuleiro, marcas ao longo dos anos representam os principais acontecimentos históricos daquele tema e os avanços em termos de direitos.
Desvendando – Na forma de um tabuleiro humano, jovens exercem o papel de detetive e tentam descobrir qual personagem foi agredido, por quem, qual a violência sofrida e onde ocorreu o crime. O jogo estimula a discussão sobre os fluxos de atendimento à criança vítima de violência.
Cyberbullying – Aborda os tipos de violências sofridas no ambiente virtual.
Encontro dos oito sentidos – É uma oficina que explora a forma como nos relacionamos e percebemos o mundo através dos seguintes sentidos: visão, audição, olfato, paladar, tato, pele, equilíbrio e intuição. O objetivo é explorar sentido a sentido, percebendo que uma mesma questão impacta duas pessoas de forma distinta. É um exercício de sensibilidade e de se colocar no lugar do outro.
“Entendemos que essas tecnologias que a gente construiu são um jeito respeitoso e ao mesmo tempo leve de falar de um tema extremamente necessário. Mas por que não dizer isso também para os profissionais?”, indaga Thiago.
Projeto capacita profissionais para lidar com violência
Em abril de 2023, surgiu a quarta etapa do projeto, que possui caráter formativo e busca democratizar essas tecnologias, estendendo-as a outros profissionais que têm, em seu compromisso ético e político, o enfrentamento às situações de violência.
Adriana Schwarz, agente de ação social no Centro de Referência de Assistência Social (Cras), e Lenny Freire, agente de saúde no Centro de Saúde Jardim Rosália, ambas em Campinas, tiveram a oportunidade de participar da nova edição do projeto. Adriana não trabalha diretamente com crianças, mas os jogos a auxiliaram na abordagem do assunto com os adultos que atende. Para Lenny, a dinâmica aguçou o olhar para as violências, temática que está no seu dia a dia na unidade de saúde.
Parceria com a Fundação Casa expande horizontes
Em 2022, o Projeto Novo Amanhecer começou o processo de formalização de uma parceria com a Fundação Casa para trabalhar com os profissionais. “Poder falar sobre isso vem como uma outra possibilidade que aquele espaço tem oferecido para eles, mas é um desafio. De garantir, inclusive, que eles consigam fazer uma discussão de acordo com a proposta e com o compromisso ético e político do projeto”, comenta Thiago. As rodas de formação têm acontecido na região dos Amarais, em Campinas, uma sexta-feira no mês.
Serviço: Projeto Novo Amanhecer
Para mais informações acesse: http://www.cpti.org.br/pdic/portfolio/novo-amanhecer/
Sobre a Fundação FEAC
A Fundação FEAC é uma organização independente que atua em Campinas (SP) com o objetivo de contribuir para criação de uma sociedade mais justa, sustentável e com igualdade de oportunidades. Para isso, investe em ações de educação, assistência social e promoção humana com foco nas regiões e nas populações mais vulneráveis, especialmente crianças e jovens, e no impulsionamento de organizações da sociedade civil, empresas e pessoas para as causas sociais.
Mais informações
Fundação FEAC
Camila Mazin – Analista de Comunicação
(19) 3794-3523, (19) 99934-2578