Imagine tocar um instrumento pela primeira vez aos 70 anos de idade? Ou, ao escutar uma melodia, se lembrar de memórias da infância? Essas são algumas das experiências que idosos de Campinas estão vivenciando no Projeto Nossas Gerações.
Por meio da oficina de musicalização, o projeto busca gerar bem-estar e melhor convivência entre os residentes de instituições de longa permanência para idosos (ILPI). Além do despertar de sensações e lembranças afetivas através da música, eles aprendem a tocar instrumentos construídos a partir de materiais recicláveis e sucata.
“A oficina de musicalização favorece as individualidades dos idosos como a valorização da própria história, fortalecimento de vínculos e a inclusão a partir das capacidades de cada um. Os momentos de integração proporcionados pelas atividades são importantes para trabalhar a história de vida deles”, diz Rebeca Silva, analista de projetos do Programa Acolhimento Afetivo da Fundação FEAC – que apoia a iniciativa.
O Projeto Nossas Gerações acontece em quatro ILPI do município: Lar São Vicente de Paulo de Campinas, Lar da Amizade, Lar Alice de Oliveira e Afascom. As atividades são conduzidas pelo músico e professor Ricardo Botter Maio, criador do projeto Pequenos Contos Sonoros.
O despertar para a música na terceira idade
Na oficina, os idosos são encorajados a participar, seja tocando algum instrumento, cantando ou apenas escutando e sentido o ritmo da música. “O projeto tem a intenção de melhorar a autoestima do residente, trabalhar a criatividade, o autoconhecimento, ampliar o repertório de música e o sentimento de pertencimento”, explica a coordenadora técnica do Lar São Vicente de Paulo de Campinas, Cintia Fagiani.
Com o auxílio do professor, eles também aprendem a construir os instrumentos utilizados nas aulas, que são confeccionados a partir de materiais que seriam descartados no lixo como tampas, garrafas plásticas, isopores e tubos de PVC.
A marimba feita de piso de porcelanato, por exemplo, é um dos instrumentos mais tocados na oficina. O seu formato é parecido com o do xilofone, normalmente encontrado como brinquedo. O instrumento possui uma sonoridade alegre e lúdica, remetendo a lembranças da infância.
“A proposta é trazer instrumentos que os idosos possam tocar. Em um momento da oficina, usamos esses instrumentos como parte da experimentação. Em outro, a gente canta algumas músicas que conhecem e eles fazem o ritmo junto comigo no chocalho, no tambor. Os idosos não apenas escutam, mas fazem parte da melodia na hora de tocar”, diz Ricardo Botter.
O professor também toca alguns instrumentos tradicionais como violão, ukulele, sanfona e piano para complementar as melodias. Em uma das aulas, ele teve uma surpresa: “Quando eu trouxe a sanfona, a gente descobriu que uma das idosas chegou a tocar em uma época da vida. Ela segurou, deu umas dedilhadas e dava para perceber que ela tinha um jeito. Eu acho que voltaram muitas memórias para ela naquele momento”, relata.
Em junho, o projeto completará um ano. Até o seu encerramento, a ideia é que os idosos desenvolvam uma melodia autoral com auxílio do professor e que seja organizado um sarau virtual para apresentações e troca de experiências entre as quatro ILPI.
Transformando a sucata em arte
O interesse em ressignificar materiais que seriam descartados no lixo em instrumentos musicais sempre existiu em Ricardo Botter: o músico queria que a sucata tivesse uma utilidade social. Foi durante as aulas de musicalização, que teve a oportunidade de colocar seu desejo em realidade.
Em 2011, Ricardo deu início ao Projeto Pequenos Contos Sonoros, uma instalação sonora feita de materiais recicláveis e sucata. O nome vem do encontro das diversas sonoridades da instalação, compostas, por exemplo, a partir de tubos de PVC, marimba de piso de porcelanato e cordas. Segundo ele, cada melodia produzida é responsável por contar uma história. “Como são várias sessões de música, para mim cada uma conta uma pequena história pois são sons e timbres diferentes”
Em 2015, estreou a instalação Pequenos Contos Sonoros no Museu da Imagem e do Som (MIS) em Campinas, e voltou a se apresentar lá novamente em 2019.
O músico já trabalhou em organizações como o Instituto de Pedagogia Terapêutica Norberto Pinto, Centro Educacional Integrado “Padre Santi Capriotti” Campinas e Associação para o Desenvolvimento dos Autistas em Campinas (Adacamp). Hoje, atua na Sorri Campinas, Associação Pestalozzi de Campinas e nas quatro instituições que fazem parte do projeto Nossas Gerações.
Até então, Ricardo só havia dado aulas de musicalização para pessoas com deficiência. Esta é a primeira vez que trabalha com idosos, e para ele tem sido transformador. “Eu tenho aprendido muito também. Além de lições da vida, musicalmente tenho aprendido algumas canções que eles apresentam. Às vezes, a gente embala numa conversa e eles contam experiências com músicas ou falam de uma certa música que traz uma lembrança”, fala.
Sobre a Fundação FEAC
A Fundação FEAC é uma organização independente que atua em Campinas (SP) com o objetivo de contribuir para criação de uma sociedade mais justa, sustentável e com igualdade de oportunidades. Para isso, investe em ações de educação, assistência social e promoção humana com foco nas regiões e nas populações mais vulneráveis, especialmente crianças e jovens, e no impulsionamento de organizações da sociedade civil, empresas e pessoas para as causas sociais.
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Camila Mazin – Analista de Comunicação
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