A fim de ampliar as atividades e propósitos de reinserção social e emancipação de mulheres em situação de rua, na região de Campinas, o Projeto Qualifica: da Cabeça aos Pés dá início a uma nova fase. Executado pela Casa de Apoio Santa Clara em parceria com a Fundação FEAC, a iniciativa visa o desenvolvimento social e econômico dessa população em vulnerabilidade social. Por meio de capacitações e oficinas, as alunas passam a ter uma nova perspectiva de futuro.
Na fase anterior, que se encerrou no final de maio, cerca de 25 mulheres passaram pelos cursos de manicure e pedicure ministrados pelos profissionais do Qualifica. Nem todas conseguiram concluí-lo, mas sete delas se formaram. A nova etapa, iniciada no dia 23 de junho, trouxe o curso de design de sobrancelhas para ser somado às possibilidades de atuação na área da beleza.
A intenção é focar na geração de renda, empregabilidade das participantes e na abertura de um salão para que elas possam atuar. Para isso, a iniciativa tem voltado seus esforços a investimentos em ações de marketing e captação e fidelização de clientes.
“Queremos chegar daqui a 18 meses, no máximo, com uma turma bem articulada, de mulheres que conseguiram terminar o curso profissionais, já dando conta e cuidando do espaço de forma mais autônoma”, revela Roberto Naiber, coordenador do projeto. Na nova turma, três das alunas já se formaram na etapa anterior e decidiram continuar os estudos.
Segundo Juliana Di Thomazo, coordenadora do Programa Acolhimento Afetivo, da Fundação FEAC, o projeto pode mudar a vida das mulheres e de seus filhos de forma substancial. “O público de mulheres em situação de rua é um dos mais vulneráveis dentro do enorme público atendido por projetos apoiados pela FEAC. Mulheres carregam marcas de violência de gênero, abandono e todos os agravantes decorrentes da pobreza. Muitas delas acabam engravidando e passam a ser ainda mais vulneráveis, alvo urgente de atenção e cuidado”, explica.
“O nosso objetivo é demonstrar, primeiro aos abrigos, e depois ao comércio que está em volta do Qualifica, no centro de Campinas, que essas mulheres não estão em situação de rua porque elas querem, mas porque, muitas vezes, faltam oportunidades. O fato de elas poderem fazer um curso faz toda a diferença para que as pessoas consigam enxergá-las de uma outra forma”, revela o coordenador.
Inclusão e cuidados para além do mercado de trabalho
Pensando nas alunas que tem filhos, o projeto também busca acolher essas crianças, para que as mães possam aprender e frequentar o curso com tranquilidade. Além de ser uma forma de inclusão, que garante a frequência dessas participantes nas aulas, as crianças se divertem, brincam e são cuidadas pelos funcionários do local. Futuramente, a ideia é que o Qualifica dê início a um trabalho terapêutico com essas crianças, junto da psicóloga e de uma especialista na área de cuidados com infâncias.
Além das capacitações, a iniciativa oferece acompanhamento psicológico às participantes. No início, esse atendimento enfrentou alguns desafios devido à dificuldade que elas demonstravam em relatar os traumas, decepções e preconceitos sofridos durante o tempo vivido nas ruas. “Se você tivesse conhecido as mulheres que começaram o curso, a maneira como elas se comportavam e estavam no dia a dia – fisicamente, na autoestima, na parte psicológica –, você veria o avanço que elas tiveram”, expõe Roberto Naiber.
Ele conta que a psicóloga trabalha por meio da reflexão sobre os problemas e toda a violência sofrida, ressignificando essas experiências para ajudá-las a seguir adiante. O projeto também oferece uma bolsa auxílio de R$ 300 – necessidade verificada na fase anterior –, que permite que as alunas tenham maiores chances de focar e se estabelecer no curso.
Ao todo, 20 mulheres integram o Qualifica atualmente. Para aquelas que já estão fazendo o curso avançado, as aulas acontecem todas as quartas-feiras, em uma turma de oito pessoas. Às quintas-feiras, é a vez da turma das iniciantes, que conta com 12 alunas. Ainda há quatro pessoas que permanecem na lista de espera, aguardando uma vaga.
Um novo olhar sobre o futuro
Para Gabrielle Alves, de 28 anos, moradora do Abrigo Feminino Santa Clara, a vida está melhor do que antes. A jovem foi uma das alunas formadas pelo Qualifica I e, atualmente, está fazendo o curso de design de sobrancelhas. Ela conta que, desde que começou a frequentar as aulas, até sua concentração melhorou e a ansiedade diminuiu. “Consegui me desenvolver bastante nas minhas dificuldades, aprendi muito e ainda quero aprender muito mais. Estou conseguindo colocar minha vida novamente no eixo”.
Seu plano para o futuro é sair do abrigo e ter uma vida estabelecida, financeira e mentalmente. “Eu estou estudando para o ENEM e me preparando para fazer concurso na Prefeitura. Enquanto isso, o Qualifica está me ajudando a conseguir uma renda melhor”, revela Gabrielle.
A coordenadora do Programa Acolhimento Afetivo, da FEAC, enfatiza que, por meio da formação, essas mulheres vislumbram a possibilidade de renda, fundamental para a sobrevivência. “O projeto melhora a autoestima, resgata esperança e apoia as participantes na construção de um novo projeto de vida”, complementa.
No caso de Luana Thompson, de 29 anos, moradora da Casa Efraim, o projeto também foi um divisor de águas em sua trajetória. Muito vaidosa, ela sempre demonstrou interesse na área de beleza e estética, chegando a fazer outros cursos além daqueles proporcionados pelo Qualifica. Assim como Gabrielle, a jovem se formou na turma anterior e continuou seus estudos para profissionalização.
Ela conta que sua paixão é fazer unhas, principalmente quando pode explorar a criatividade a partir das extensões em gel e aplicação de fibras de vidro, técnicas aprendidas nas aulas e que estão super na moda. “Estou começando a atender aqui, as clientes ligam e eu venho fazer a unha delas. Eu também faço as unhas das meninas lá no abrigo. Estou esperando meu auxílio sair para eu comprar meu forninho, que serve para fazer unha em gel. Aí, dá para começar a atender em casa”, comenta Luana.
Para a jovem, que viveu quatro meses nas ruas, o projeto é uma oportunidade de aprender uma profissão e melhorar a própria vida. “Se não fosse o Qualifica, eu acho que eu estaria por aí na rua, sem nada para fazer, pensando em coisa errada. Pelo menos, aqui é um tempo que eu saio do abrigo e fico fazendo outras coisas”. Ela diz adorar as colegas de turma e as professoras, que acabam sendo um incentivo para que ela continue se empenhando e frequentando as aulas.
Seu objetivo é continuar fazendo cursos e se aperfeiçoando. “Por enquanto, vou começar devagar, atendendo as clientes, postando meu trabalho. Quem sabe, mais para frente, eu não posso abrir um salão?”, compartilha.
Sobre a Fundação FEAC
A Fundação FEAC é uma organização independente que atua em Campinas (SP) com o objetivo de contribuir para criação de uma sociedade mais justa, sustentável e com igualdade de oportunidades. Para isso, investe em ações de educação, assistência social e promoção humana com foco nas regiões e nas populações mais vulneráveis, especialmente crianças e jovens, e no impulsionamento de organizações da sociedade civil, empresas e pessoas para as causas sociais.
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Fundação FEAC
Camila Mazin – Analista de Comunicação
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