Por Carolina Meira

A definição de metodologia ativa pode ser simples e direta: processo de ensino e aprendizagem onde o protagonista é o aluno. Mas será que estamos pensando e agindo sobre as condições para que tal processo consiga realmente ser colocado em prática? Foi essa reflexão que abriu o terceiro e último encontro virtual da 11ª Semana da Educação de Campinas, com o tema “Implementar tecnologias e metodologias ativas”.

A live – que já conta com mais de 1.200 visualizações – foi transmitida na tarde de 21 de outubro no canal do YouTube da Fundação FEAC e teve mediação de Flávia Vivaldi, professora e pesquisadora na área da educação. Entre os convidados para debater estavam Glauber Ferreira, diretor da Escola Estadual Culto à Ciência, Mickaelly Silva, aluna representante da Escola Estadual Carlos Gomes e Luciana Vitor Cury, especialista em educação.
Conceitos e novos olhares

Luciana iniciou a conversa explicando os conceitos e destacando que as metodologias ativas são abordadas pela pedagogia e pela psicologia cognitiva há bastante tempo, ainda que com outros nomes. “Metodologia ativa é convidar o aluno a ser mais protagonista. Já tecnologia é qualquer conjunto de técnicas e habilidades de uma determinada área”, esclarece a especialista. Cury acredita ser necessário interromper o discurso de que a escola pública desconhece o tema ou está muito distante dele e, no lugar, zelar pelas condições para que esse processo de ensino e aprendizagem seja implementado de fato, considerando quais equipamentos precisam estar disponíveis para isso.

Outro ponto levantado foi a confusão do termo tecnologia com equipamentos eletroeletrônicos ligados à internet. “Tecnologia é conhecer profundamente técnicas, métodos e estratégias para resolver um determinado problema, questão ou situação. Os equipamentos eletroeletrônicos e a internet, por exemplo, são na verdade ferramentas para ajudar a resolver esses problemas”, explica Luciana.

E por que ligar tecnologia a metodologias ativas? “Se eu preciso convidar o aluno para vir ao centro do processo, posso olhar para determinados equipamentos e pensar: essa é uma ferramenta que aumenta as minhas habilidades. Sempre estamos buscando melhores ferramentas para resolver os problemas cotidianos da escola”, completa.

O papel das políticas públicas

Mas não basta entender o que são as tecnologias e metodologias ativas sem pensar no papel que as políticas públicas de educação exercem para garanti-las, destacam os convidados. É preciso investir na jornada de trabalho – tempo de estudo e aprimoramento – e no plano de carreira, na valorização dos professores, e essas são responsabilidades do Estado. Em tempos de eleições municipais, Luciana Cury relembra que os candidatos devem dizer como vão equipar as escolas e gerir a jornada dos professores.

Além da necessidade de processos de formação continuada e de valorização da carreira docente, olhar para a infraestrutura física das escolas é outro ponto de grande importância, complementa Glauber Rocha, diretor da Escola Estadual Culto à Ciência. “Os gestores escolares acabam dedicando muito tempo para resolver esse tipo de problema, e um tempo que deveria ser dedicado ao pedagógico, não é. Os prédios escolares devem ter uma ótima estrutura, assim como mobiliário, equipamentos tecnológicos, materiais de papelaria, tudo o que é necessário para dar andamento às aulas”, comenta Glauber.

A voz dos estudantes

E o que os estudantes, público-alvo das políticas públicas de educação, têm a dizer sobre a participação e o protagonismo por meio das metodologias ativas? “Precisamos dessa troca dentro da sala de aula, onde o aluno aprende, mas o professor também. Porque quando a gente se sente parte, aprendemos muito mais do que quando só recebe, escuta ou lê”, comenta Mickaelly Silva, aluna da Escola Estadual Carlos Gomes.

Para Mickaelly, é necessário desconstruir o atual modelo hierárquico de ensino, que às vezes pode colocar o professor como uma figura distante dos alunos. “O professor está ali para nos ensinar, para ter uma troca com a gente. E nós enquanto alunos precisamos participar, ocupar mais os nossos espaços. A construção da escola tem que ser feita junto com o aluno e o aluno deve participar e perceber que ele é um agente super importante para essa construção conjunta”, defende a estudante.

E essa construção coletiva é vista também como um exercício de democracia. “Nós que trabalhamos com formação de professores, e que temos a oportunidade de ter muitos professores nos assistindo hoje, podemos colocar holofote naquilo que vem sendo uma batalha para a educação… Que é de fato uma construção coletiva, uma troca de saberes, e o quanto os alunos podem nos ajudar nesse processo de novas tecnologias”, comenta Flávia Vivaldi. “Precisamos de fato ter um exercício do diálogo e da democracia, não só nos projetos político-pedagógicos ou no discurso, mas na prática”, reflete a educadora.

Acolhimento e metodologias ativas pós-pandemia

A participação ativa dos estudantes passa a ter um papel ainda mais estratégico no panorama desafiador do período pós-pandemia para a educação, que envolverá, entre outras questões, o socioemocional, a aprendizagem e o enfrentamento da evasão escolar. “Nós temos um cenário avassalador que nos coloca o compromisso de trazer de volta muitos alunos, de engajar esses estudantes no seu direito à educação de qualidade. Nós temos que começar daí, a trazer de volta, e depois criar condições para que todos e todas tenham oportunidades mais iguais do que a gente tem hoje”, ressalta Flávia.

Na visão dos estudantes, o acolhimento socioemocional é o caminho e será preciso um tempo de adaptação. “É importante trazer o aluno para dentro da escola como um ambiente de acolhimento. Um ambiente de ‘estamos juntos’: entre professores, diretores, alunos”, comenta Mickaelly. Para a jovem também é necessário trabalhar habilidades como autoconhecimento e, ao invés de retomar as disciplinas de onde estavam antes, é válido contextualizar conteúdos e adaptá-los ao momento. “No pós-pandemia eu quero que os alunos sejam mais presentes, participem mais, tenham mais oportunidade de fala e também uma escuta ativa com os professores e com a escola”, compartilha a estudante.

Além do aspecto socioemocional, o acolhimento envolve questões pedagógicas e ainda ações intersetoriais, complementa Glauber. “Está ocorrendo uma grande defasagem de aprendizagem e isso não vai ser recuperado de imediato, precisaremos de um longo tempo para recuperar as habilidades que os alunos não estão conseguindo desenvolver em casa”, destaca. “E a escola também vai precisar de muita ajuda, nós precisamos de parcerias – com a Secretaria de Saúde, de Assistência Social – para resolver diversos problemas que irão aparecer nesse retorno”, finaliza o diretor, que acredita que os jovens protagonistas e as metodologias ativas terão um papel crucial para contribuir com soluções para diversos desses problemas.

“Nenhum a menos e ninguém para trás”: a reflexão de Luciana Cury concluiu a tarde de trocas e conversas. “Juntos a gente tem que voltar sabendo que estamos comprometidos com isso: nenhum aluno, professor, funcionário e família a menos”, diz a especialista. Para ela, tanto as dinâmicas que colocam o aluno como protagonista quanto a adoção de tecnologias que interagem mais com os estudantes podem contribuir com o cenário desafiador. “Vamos buscar soluções para isso – ter todo mundo e todos conseguindo recuperar o que ficou para trás – num grande pacto coletivo das escolas. E aí as metodologias ativas, alguns equipamentos e tecnologias se apresentam como possibilidade e potencializam o nosso trabalho”, aponta.

A live rendeu diversas interações entre o público durante o chat ao vivo, com trocas de ideias, experiências e opiniões sobre o tema. Para Flávia Martins Guimarães, assessora de Educação e Cidadania na Secretaria Municipal de Educação de Campinas e membro do Comitê Gestor da Semana da Educação, esse é um diálogo muito importante para a educação pública. “A geração atual pede que a educação escolar faça sentido para a vida real, seja um aprendizado que integre o estudante como ser ativo e o apoie no acesso a saberes que lhe permita estar no mundo fazendo a diferença. Em síntese, aprender para fazer algo com sentido para a melhoria de sua vida e da sociedade. O aprendiz é um ser vivaz, e a ‘inter-ação’ gera conhecimento significativo”, comenta.

Semana da Educação

A 11ª Semana da Educação de Campinas aconteceu de 19 a 23 de outubro como um espaço de voz de quem está na sala de aula, especialistas, candidatos e de conexão com o poder público. O evento, já consolidado na agenda da cidade, é um movimento suprapartidário organizado pelo Comitê de Governança, composto pela Fundação FEAC, Fundação Educar DPaschoal, Secretaria Municipal de Educação de Campinas e Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, por meio das Diretorias de Ensino Leste e Oeste de Campinas.

O objetivo da iniciativa é mobilizar a sociedade para o diálogo sobre a educação pública, colocando o tema em evidência e reconhecendo que a educação deve ser um projeto de política pública, contribuindo assim para um ensino/aprendizado cada vez melhor.

A realização da 11ª Semana da Educação tem o patrocínio da Fundação Educar DPaschoal e Iguatemi Campinas.

Saiba mais em: semanadaeducacao.org.br