Ingrid Vogl
Na sala de aula do 3º ano do ensino fundamental, cheia de cartazes coloridos com letras e números, a professora Neusa Maria da Silva Miranda dita uma história enquanto os alunos atentos, sentados em duplas e com a animação típica de crianças de oito e nove anos, escrevem em seus cadernos. Observando a cena corriqueira na Escola Estadual Prof.ª Rosentina Faria Syllos, é difícil adivinhar que após 32 anos de profissão, a docente voltou para a sala de aula como voluntária, por amor e prazer em alfabetizar.
Com uma conta rápida, a professora dos anos iniciais (1º ao 5º ano), soma cerca de 1 mil crianças alfabetizadas em toda sua trajetória pedagógica. “Voltei porque amo meu trabalho e por me sentir muito bem lecionando. Para mim, isso é saúde, é qualidade de vida e é o que eu sei fazer e sinto que ainda tenho muito a ensinar para as crianças”, definiu.
A ideia de se voluntariar para voltar a dar aulas na unidade onde trabalhou desde 2008, surgiu logo que Neusa Miranda se aposentou em dezembro de 2015. “Comecei a ficar aflita em casa por falta de atividades e comentei isso com a professora Tatiana, até então minha colega de trabalho. Foi ela quem me incentivou a voltar para a escola”, contou.
Após a equipe gestora da EE Profª Rosentina Faria Syllos ter concordado com o retorno de Neusa às salas de aula, dessa vez voluntariamente, houve uma bela acolhida na escola. “Foi quando consegui me reencontrar de novo e estou feliz aqui”, disse, com um sorriso satisfeito.
Atualmente, Neusa é professora auxiliar em uma sala do 3º ano, com alunos que precisam consolidar a alfabetização. Leciona duas vezes por semana e está ajudando a nova educadora, Adriana, a promover um rápido avanço dos alunos. Com o trabalho retomado na escola, os colegas já a convidaram para acompanhar outras turmas, pela empatia que a docente tem com o grupo e por ser conhecida pelo sucesso alcançado em casos de aprendizagem considerados difíceis.
“Gosto de trabalhar a alfabetização dos alunos, porque é muito gratificante vê-los serem transformados, descobrindo, produzindo, lendo e tendo autonomia. O conhecimento promove a autoestima das crianças e faz com que elas acreditem nelas mesmas, independentemente do grau de dificuldade de cada um. Para isso, é preciso que o professor motive e respeite o limite de cada estudante e acredite no potencial”, ensinou.
Estratégias
Em mais de três décadas dedicadas a alfabetizar, Neusa desenvolveu várias estratégias de ensino, entre elas, a de que em uma sala de aula há maneiras diferentes de se ensinar. “Sempre avalio em que nível o aluno está e de acordo com o resultado e suas necessidades, traço um plano em sala de aula para auxiliá-lo individualmente. Também gosto do trabalho em grupo, onde um aluno ajuda o outro e, assim, aprendem juntos”, contou.
Os ensinamentos da professora Neusa são levados para os anos seguintes pelos ex-alunos. “Se a gente não sabe ler, a gente não sabe fazer quase nada, nem resolver contas. Nunca mais esqueci como se faz a divisão. Todas as broncas da professora valeram a pena, e com certeza vou levar isso pra vida inteira”, disse a esperta Esther Gabriela Antonio Silva, aluna do 4º ano.
Rafaela Caroline Barbosa, também do 4º ano, foi aluna de Neusa durante dois anos e dá a exata dimensão do trabalho da educadora. “Vim de uma escola particular e lá, a professora não me dava muita atenção. Ela só ajudava os alunos que já sabiam tudo. Mas aqui, a professora me ajudou no que eu precisava e consegui aprender tudo que os outros aprendiam”, contou orgulhosa de seu conhecimento.
“Quando a gente aprende, podemos ser o que quiser”. A fala da pequena Lorena Cardoso Costa, do 4º ano, demonstra que nesses tempos difíceis de crise e desvalorização da educação, histórias como essa servem de inspiração para se acreditar que ensinar e aprender é o caminho para um futuro promissor.