(Por Laura Gonçalves Sucena)

Percebendo a realidade do território onde vivem e preocupados com a violência contra as mulheres, um grupo de adolescentes de 14 e 15 anos da Organização da Sociedade Civil (OSC) Ação Forte, localizada na região Norte de Campinas, decidiu se unir e criar o projeto “Cicatrizes se transformam em lutas”. O intuito é conscientizar a juventude e fortalecer mulheres jovens no combate a atitudes machistas que sofrem no dia a dia e colocar em pauta o feminicídio.

A ideia do projeto surgiu dentro da oficina de cidadania da instituição, que trabalha o protagonismo juvenil e é comandada pelo educador Júlio Silva.  “Visamos fortalecer os vínculos dos adolescentes com a comunidade e com o território e despertar a autonomia. Nas nossas conversas os próprios adolescentes trouxeram o tema do feminicídio, por ser uma realidade próxima e assim surgiu o “Cicatrizes se transformam em lutas”. Foi uma demanda deles”, explicou.

Com início em março, o projeto começou com o estudo e discussão dos 30 artigos dos direitos humanos e dos direitos da juventude. Nas diversas atividades, os adolescentes debatem e discutem temas como machismo, direitos da mulher negra, questões de gênero entre outros.  “Aqui temos um espaço de reflexão. Os jovens se questionam e acabam revendo padrões impostos pela sociedade há anos”, comentou Júlio.

Feminicídio

Para os adolescentes protagonistas, o motivo da escolha do tema feminicídio se deu pela falta de informação e pelo crescente número de casos na região. “Queremos que nosso projeto seja um instrumento de transformação na vida de muitos jovens. Por isso ele irá culminar numa palestra aberta para pessoas interessadas. Queremos motivar outros jovens, comunidade e familiares sobre o tema”, falou a estudantes Ana Clara Galvão, 15 anos.

“Temos percebido um aumento da violência contra a mulher não só por meio dos noticiários, mas também em casos locais do nosso bairro. O machismo ainda está incutido na sociedade. E muitos de nós não conversamos sobre isso. Em casa mesmo, eu tento passar para o meu irmão mais novo que somos todos iguais e que tem que haver respeito”, comentou Vitor Benetti, 15 anos.

Nos encontros que acontecem na instituição, os adolescentes discutem a violência contra a mulher. A estudante Ana Clara explica que mulheres, inclusive as mais jovens, sofrem por desconhecerem seus direitos e não conseguirem identificar a violência que lidam nas relações e muito menos denunciar. “As jovens são as mais vulneráveis e por isso são as primeiras vítimas desse feminicídio, que ocorre primeiro por toques indesejados, olhares invasivos e palavras sexistas”, contou.

Beatriz Magalhães, também de 15 anos, concorda com a amiga e diz que o projeto se torna importante porque o tema tem que ser discutido por jovens. “Ainda há muito preconceito e machismo na sociedade. Temos que fortalecer as mulheres jovens para o enfrentamento dessa cultura violenta e promover aos garotos uma reflexão sobre seu comportamento machista e o quão urgente se faz necessário mudar essa postura”, alertou.

Protagonismo

Para o encerramento do projeto, os jovens estão planejando uma grande palestra. “Eles entraram em contato com a Fundação FEAC e, por meio do programa Enfrentamento a Violências, conseguiram um apoio. Agora estão correndo atrás de materiais de publicidade e toda a organização. Isso é protagonismo juvenil”, comentou Júlio. 

Para Natália Valente, líder do programa Enfrentamento a Violências da Fundação FEAC, o “Cicatrizes…” busca romper com a naturalização das violências, conscientizando potenciais vítimas sobre os fenômenos e as estratégias para a autoproteção. “Esse é um dos objetivos do nosso programa e perseguir esses desafios, por meio do protagonismo dos jovens, dando destaque ao feminicídio como temática principal, é uma contribuição fundamental para impactar na redução dos índices”, afirmou.

A data marcada é dia 22 de outubro, no Espaço Cultural Maria Monteiro, localizado na Vila Padre Anchieta.  O encontro, que contará com depoimentos e palestra, será gratuito e toda comunidade será convidada.

“Nos dividimos em grupos e cada um corre atrás de algumas coisas. Fomos atrás de apoio, conseguimos o espaço, estamos correndo atrás de palestrante. O começo foi meio confuso porque fizemos um calendário, mas perdemos todos os prazos. Daí percebemos que era preciso levar a sério e a coisa andou. Estamos muito animados”, contou a estudante Evelyn Carvalho.

Agora os adolescentes estão correndo atrás da impressão de cartazes que serão colocados em escolas, centro de saúde, pontos de ônibus e outros locais com grande circulação de pessoas. “Somos a próxima geração e temos que ser protagonistas de nossas vidas. Queremos mostrar para os adultos e também para as crianças que conseguimos tomar atitudes relevantes, fazer coisas que realmente importam.  Só assim vamos ser exemplos de mudança”, finalizou Ana Clara.

Sobre o Enfrentamento a Violências

O programa é uma iniciativa da Fundação FEAC que investe na mitigação dos impactos das violências e no enfrentamento para romper os ciclos que as perpetuam com objetivo de promover o bem-estar e a cultura de respeito, empatia, tolerância e paz.

Mais informações: https://www.feac.org.br/enfrentamentoaviolencias/