(Ingrid Vogl)

O sorriso largo de Jonathan Rodrigues, 26 anos, expressa sua felicidade e realização pelas conquistas que teve até agora em sua trajetória como bailarino profissional. Sua história cruzou a dança quando ele tinha 9 anos de idade e começou a frequentar a oficina de ballet do Centro Promocional Tia Ileide (CPTI), entidade parceira da Fundação FEAC. Até hoje, a unidade na Vila Francisca, onde mora sua família, oferece o ballet a crianças a partir dos 7 anos.

Segundo Jonathan, tudo começou porque a irmã já fazia ballet e ele gostava de assistir as aulas que ela frequentava, mas não tinha coragem de participar por causa do preconceito que temia enfrentar. Foi aí que Lucia Helena Negri Teixeira, responsável pela oficina e diretora do projeto Dança e Cidadania, que mantém parceria com o CPTI, o convidou para fazer uma aula.

“Eu percebia que o Jonathan sempre observava as aulas que a irmã e a prima frequentavam, mas era resistente em participar. Um dia eu pedi para que ele entrasse e depois disso, ele nunca mais saiu”, relembrou a professora. De acordo com Lucia, foi logo na primeira aula que a professora percebeu o potencial de Jonathan para ser um grande bailarino. “Me lembro que cheguei a comentar com uma colega de trabalho: ele não é para ficar aqui, ele é para o mundo”.

A aposta de Lucia, uma espécie de presságio, se concretizou e a partir daquele momento, o menino começou a percorrer seu caminho com determinação. A postura de Jonathan, a maneira de finalizar os movimentos e a forma com a qual assistia as aulas chamaram a atenção da professora. Após alguns meses frequentando a oficina do CPTI, ele foi encaminhado para aulas diárias de três horas na academia Ballet Harmonia, que mantém o projeto Dança e Cidadania, pelo qual, desde 2001, 6 mil crianças já passaram.

Sobre o momento em que Jonathan teve a certeza de que queria seguir a carreira de bailarino, ele se lembra muito bem. “Foi quando me apresentei pela primeira vez em um palco. Foi no teatro Castro Mendes, no espetáculo Sítio do Pica Pau Amarelo. A partir dali, quis trabalhar muito para ser alguém na vida e poder mostrar às pessoas ao meu redor que um menino pobre que nasceu em uma periferia de Campinas podia ser um bailarino profissional”, disse.

Bailarino nato

Naquela época, a professora Lucia também previu a profissionalização de Jonathan e futuramente, sua posição como 1º bailarino em uma companhia internacional de dança. No ballet, o bailarino principal, ou 1º bailarino, é quem executa os primeiros papéis no repertório de uma companhia de bailado. É o nível mais alto que pode ser atingido no ballet.

Após se formar como bailarino profissional, Jonathan começou a trabalhar na Cisne Negro Cia. de Dança, em São Paulo/SP. Após três meses, ele teve a oportunidade de fazer parte de uma companhia de ballet em Joanesburgo, na África do Sul. Isso aconteceu em 2009, quando Jonathan começou a atuar na companhia de dança Joburg Ballet. Foi Lucia quem deu apoio e inclusive condições para que Jonathan se mudasse: comprou roupa de cama, providenciou aulas de inglês e até mesmo angariou malas para a viagem. “Ele era um menino que não ia nem para São Paulo de ônibus e ganhou o mundo”, rememorou.

Naquele momento, a intuição de Lucia voltou com força. “Quando ele foi para Joanesburgo, eu disse que teria condições de ser o 1º bailarino”. E novamente o pressentimento da professora se tornou realidade. “O menino me ligou todo feliz dizendo que havia se tornado o 1º bailarino e eu pude assisti-lo na estreia do espetáculo Bela Adormecida, em 2009”, recordou.

Jonathan continuou se firmando em sua carreira e fez espetáculos por toda a África e outros países, como Dinamarca. O bailarino continua a voar nos palcos pelo mundo. No início de 2017, ele se mudou para Helksínquia, capital da Finlândia, e lá é solista. Sua rotina diária é praticar ballet das 10h às 17h. Quando apresentações se aproximam, o trabalho se estende até as 22h.

Mas a trajetória do bailarino no mundo dessa arte em movimento em que prevalece a beleza, estética e a musicalidade, não foi fácil.  Segundo ele, o preconceito – por ser menino e praticar ballet – sempre esteve presente, principalmente entre os colegas de escola. “Fui persistente e me dediquei com muito trabalho. Tive sorte também pelo suporte da minha família. E sempre desejei sabedoria para as pessoas que me humilharam pelas escolhas que fiz para minha vida”, afirmou.

Gratidão

Sempre que visita sua família, que ainda mora na Vila Francisca em Campinas/SP, Jonathan comparece ao CPTI, onde demonstra seu carinho por toda a equipe e participa de rodas de conversas com as crianças e jovens atendidos pela entidade. Os educandos consideram o bailarino uma referência.

Para crianças que, como ele, têm a oportunidade de ter contato com alguma arte ou conhecimento que desperte a vontade de se profissionalizar, Jonathan tem um conselho. “Faça aquilo que você ama e nunca desista desse sonho. Não deixe ninguém tirá-lo da meta que você escolheu para seu futuro. Haverá situações que vão te deixar desanimado e desacreditado, mas seja forte”, ponderou.

Da época em que frequentava as oficinas do CPTI – ele também praticou taekwondo, futebol, voleibol, handebol, informática, música – Jonathan só tem boas lembranças. Segundo ele, a instituição é um meio para ajudar as crianças a descobrirem o que querem para o futuro e aprenderem atividades novas que nunca teriam a oportunidade de desenvolver ao longo da vida.

“Sou muito grato pelas experiências que tive no CPTI. Se não fosse minha passagem pela entidade, eu não teria conhecido o ballet e não teria chegado onde cheguei”, ressaltou.

Segundo Nadir Semenzin Braga da Silva, assessora técnica do Departamento de Assistência Social da Fundação FEAC, no processo de definições, buscas, encontros e desencontros, a criança, adolescente e jovem precisam preencher espaços na sua formação para dar sentido à vida. “Ofertas possibilitaram escolhas na vida do Jonathan. A arte indicou um caminho que foi possível graças a um olhar sensível que identificou habilidades que foram canalizadas para se tornarem competências. E assim, a vida segue e a arte cumpre o seu papel, sua função social”, analisou.

Mais do que oportunidades, por meio do ballet as crianças e adolescentes levam aprendizados para toda a vida. “A maioria dos educandos que pratica a dança não segue a carreira profissional, mas certamente leva para a vida aprendizado, responsabilidade e determinação.  Sempre acreditei que a maioria das pessoas precisa de uma única oportunidade para os tornar um talento. E foi exatamente isso que Jonathan fez”, concluiu Lucia.

Além de seguir a carreira internacional, Jonathan tem outros planos. “No futuro, quero poder passar todas as minhas experiências para outras crianças e jovens que também gostam dessa arte, assim como eu tive essa oportunidade”, concluiu. Alguém duvida que o talentoso bailarino continuará voando?

CPTI 

O Centro Promocional Tia Ileide (CPTI) oferece oficinas ligadas à diferentes artes e projetos temáticos que visam promover a garantia de direitos de crianças, adolescentes e de grupos familiares.  

Atualmente, são atendidos 540 educandos que praticam diversas atividades de segunda a sexta-feira na entidade. O CPTI conta com cinco unidades em funcionamento localizadas na região Norte de Campinas.

A oficina de ballet, realizada durante dois dias da semana, é a única no CPTI feita em parceria. Nesse caso, com o projeto Dança e Cidadania, da academia Ballet Harmonia. “As crianças e adolescentes que frequentam o ballet acabam adquirindo o gosto pela arte e desenvolvem disciplina, autoestima, responsabilidade e cidadania”, afirmou Fabíola Almeida Cavalcanti, gerente de mobilização de recursos e comunicação do CPTI.

Nos casos de crianças que se destacam nas oficinas, que tem uma proposta focada no desenvolvimento social, elas são encaminhadas para projetos onde têm a oportunidade de desenvolver seu potencial, já que a entidade tem o foco em serviços para pessoas em situação de vulnerabilidade social.

Além do fortalecimento de vínculos com os educandos, o CPTI preza pela aproximação com as famílias dos atendidos. Segundo Thiago Lusvardi, psicólogo da Unidade Vila Mendonça do CPTI, sempre que crianças chegam à instituição é feita uma apresentação do serviço aos familiares e da rotina dos atendidos. “Só dos responsáveis pelos atendidos conhecerem o dia a dia aqui no CPTI, o fortalecimento de vínculos já está sendo promovido”, afirmou.

 

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