(Por Ingrid Vogl e Laura Gonçalves)

Com o tema “Garantia de Direitos no Fortalecimento do SUAS – Sistema Único de Assistência Social”, a XII Conferência Municipal de Assistência Social de Campinas/SP aprovou nove propostas que norteiam a política pública para o município, duas para o Estado e outras quatro para a União.  O objetivo é aprimorar a oferta de serviços em todas as instâncias de governo de forma a torná-la mais acessível e próxima às demandas da população e contribuir com o desenvolvimento da política de assistência social.

Se por um lado, o nível de exigência do serviço de assistência social aumenta cada vez mais, os recursos financeiros para investimentos em equipamentos públicos, material e profissional e na ampliação dos serviços são insuficientes. Este tema, inclusive, está presente nas propostas que foram discutidas e escolhidas para serem enviadas aos três níveis de poderes públicos para que componham as políticas públicas assistenciais municipal, estadual e federal.

Uma das principais reivindicações dos usuários e profissionais que participaram da Conferência foi a ampliação do atendimento do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), que desenvolve ações de identificação, referenciamento e prevenção das vulnerabilidades sociais da população, e é a porta de entrada da política de assistência social no município.

Atualmente, existem 12 unidades do CRAS em Campinas. Eles são responsáveis pela organização e oferta dos serviços socioassistenciais da Proteção Social Básica do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) nas áreas de vulnerabilidade e risco social dos municípios, propiciando o acesso aos indivíduos e famílias à rede de proteção social de assistência social.

Jane Valente, secretária municipal de Assistência Social e Segurança Alimentar, avalia que o Plano Municipal de Assistência Social aponta a necessidade de um maior número de Centros no município. “Nos locais onde não temos os CRAS, os Distritos de Assistência Social (DAS) são responsáveis pelo atendimento, mas com as propostas retiradas da Conferência e os dados da Vigilância Socioassistencial, iremos verificar as áreas de maior vulnerabilidade para traçarmos a delimitação do CRAS para Campinas”, analisou.

Flaviana Pena, psicóloga da instituição Direito de Ser, parceira da Fundação FEAC, disse que é preciso que os usuários saibam buscar caminhos para debater assuntos relativos à assistência. “A população sabe o quão difícil é o acesso ao CRAS, como tem falta de profissionais nos serviços e o tanto que falta de informação. É preciso participar e trocar informações, saber o que acontece e isso foi amplamente discutido durante a Conferência”, afirmou.

Segundo Carlos Lúcio de Souza, liderança comunitária na Vila Olímpia, região Norte de Campinas, há uma demanda de usuários maior do que os serviços oferecidos e a luta é pela construção de um CRAS. “Só temos na região o Distrito de Assistência Social da Região Norte (DAS), que atende moradores de cerca de 20 bairros. As pessoas precisam se deslocar por até 15 quilômetros para receber atendimento e uma de nossas propostas de território é justamente criar equipamentos sociais e ampliar o atendimento com qualidade”, afirmou. Ele também criticou os critérios usados pelo poder público para definir o atendimento às famílias referenciadas. “É muita burocracia e critérios descabidos. O governo deveria ter um olhar mais social, um atendimento mais humanizado para atender as famílias”, finalizou.

Pessoas em situação de rua

 Presentes em peso nas discussões que ocorreram durante a Conferência, as pessoas que vivem em situação de rua reivindicam a ampliação e integração dos serviços dedicados a estes usuários.

Morador da ocupação Nelson Mandela e membro da Comissão do Movimento Nacional de População de Rua, Fernando José Bartolomeu participou da Conferência para reivindicar número maior de abrigos para os moradores de rua.

“É preciso haver uma atenção maior a essa população. Campinas tem 1.400 pessoas que vivem na rua e um albergue para 150. A burocracia para se entrar num abrigo é muito grande e isso desencoraja as pessoas. Os abrigos não são adequados e queremos melhores condições físicas. Isso não pode ficar assim”, destacou.

Segundo Jane Valente, nos últimos anos alguns serviços foram ampliados, como o SOS Rua, que está em todas as regiões do município, e também foi criado o Centro Pop – Centro especializado para atender a população de rua. Outro grande ganho foi a criação de dois abrigos para mulheres.

“A crítica que temos hoje é que o Centro Pop da Rua Regente Feijó, no Centro da cidade, é inadequado e nós concordamos. Estamos em busca de um novo espaço e teremos algo adequado em breve. A busca nunca parou e nosso trabalho é para melhorar sempre. Pensamos que os abrigos devem estar onde a população de rua está, mas nem sempre a sociedade aceita. As pessoas têm que entender que a população de rua é um problema de todos”, afirmou a secretária.

Bianca Fricke, representante do movimento da população de rua, concorda que os serviços destinados a moradores em situação de rua precisam chegar até os bairros mais periféricos e ressaltou a necessidade do trabalho social ser intersetorial, garantindo assim um atendimento integral que incentive a autonomia dos usuários.

“Não existe a intersetorialidade que deveria ter, porque não adianta ter um serviço de assistência se trabalho e renda não estiverem presentes, sem a educação, o lazer, cultura, o transporte. Não adianta uma pessoa que está em situação de rua, desempregada, ir até o abrigo e ganhar um pão com manteiga. Não vai melhorar a vida dessa pessoa e será apenas uma ajuda paliativa. A gente luta para ter autonomia, não ficar dependente, tem que ter resultado. Não existe um apoio que foque no projeto de vida para a pessoa em situação de rua”, opinou.

Propostas e participação

 As discussões que ocorreram durante toda a Conferência foram qualificadas e lotaram as salas do auditório Dom Gilberto, no campus I da PUC Campinas. Para a secretária, a Conferência visa avaliar e contribuir para o desenvolvimento da política pública e traçar novos objetivos. O grande ganho desta conferência é a maior aproximação dos usuários. “Eles entenderam que é preciso participar e reconhecem não só as entidades de atendimento, mas também a política pública de assistência social”, avaliou.

Presidente do Conselho Municipal de Assistência Social (CMAS), Celina da Costa Silva, também elogiou a participação da população e dos usuários desde as pré-conferências. “A finalidade da Conferência é dar voz ao cidadão e, com toda a atenção e respeito, ouvir os usuários e trabalhadores do SUAS. Conseguimos isso com muito respeito e todo o trabalho realizado foi positivo”.

Para o gerente do Departamento de Assistência Social (DAS) da Fundação FEAC, Lincoln Moreira, a Conferência foi um espaço de escuta e de discussão de propostas da Assistência Social. “Nos últimos anos a política da assistência social obteve vários avanços e, muitos deles, por conta da participação da sociedade. Foi um momento para conferir, avaliar, debater e elencar metas futuras”, reconheceu.

Carlos Lúcio de Souza, liderança comunitária da região Norte de Campinas, avalia que a participação dos usuários nestes espaços em que se discutem políticas públicas é essencial, pois é o caminho para que haja melhora no serviço de assistência social no município. “Nossa luta é para que as propostas aprovadas tenham sequência em outras instâncias do poder público e assim, serem de fato praticadas. Mais do que participar pontualmente da conferência, nós como usuários temos que estar presentes no dia a dia e monitorar e cobrar a garantia do acesso aos serviços sociais de qualidade”, disse.

Na opinião de Juliane Silva Magalhães, cuidadora do Centro Educacional Integrado Padre Santi Capriotti, instituição também parceira da FEAC, a presença em peso dos trabalhadores e dos usuários nas discussões qualificadas e nas votações que ocorreram durante o sábado é um indicativo de que usuários e profissionais estão fazendo sua parte nos debates sobre os rumos da política de assistência social. “Nossa expectativa é de que as propostas de fato sejam efetivadas. A população merece, porque muita gente precisa desse tipo de serviço. Se nossas propostas chegarem até o governo, já é um ganho”, admitiu.

Para Ana Beatriz Bernardes de Souza, psicóloga da rede assistencial, o maior desafio da área é garantir a efetivação da lei por meio do desenvolvimento da política de assistência pública, fugindo assim do assistencialismo.  “A situação do país está feia, vivemos uma crise pesada e nossa política pública está precária. Por tudo isso, precisamos proteger os direitos sociais dos cidadãos e isso acontece em espaços de controle social como este. Por meio deles é que a gente pode apoiar e cobrar política pública dos políticos.  Fortalecer esses espaços pode ser um caminho para enfrentar essa crise gigantesca”, afirmou.

O usuário Tadeu Alves também decidiu participar da Conferência em função da precariedade do serviço público. “Acredito na igualdade de direitos e vim aqui para contribuir com o que penso sobre isso. Essa é nossa chance de dizer o que pensamos. Gostei muito das propostas que incluem a capacitação continuada para usuários e trabalhadores. Isso é nosso direito. É preciso saber o significado dos termos técnicos, das siglas, para que o cidadão não fique confuso. Capacitar é dar poder ao cidadão para ele acesse seus direitos”, completou o bancário.

Pré-conferências

As Pré-conferências, que antes serviam apenas como ‘aquecimento’ para a Conferência Municipal, foram este ano oportunidades para a elaboração das propostas que seguiram para discussão e plenária final da etapa municipal.

Com o intuito de motivar e preparar usuários, trabalhadores e cidadãos, o Conselho Municipal de Assistência Social (CMAS), em parceria com a Fundação FEAC, realizou uma formação voltada aos chamados agentes facilitadores. A eles coube a condução dos grupos de discussão que se reúnem nas Pré-conferências.

O conteúdo do primeiro encontro das formações de facilitadores propôs o conhecimento e detalhamento dos eixos da Conferência para a apropriação dos participantes. Também foi trabalhada a construção coletiva das diretrizes e parâmetros comuns para o planejamento das cinco Pré-conferências regionais. A segunda oficina levou contribuições de metodologias participativas. Já a terceira e última etapa da formação propôs a análise das experimentações das metodologias apontadas para a participação nas Pré-conferências, assim como a sistematização destas inovações.

 

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