Força de vontade e carisma eles têm de sobra, mas ainda falta oportunidade para eles mostrarem do que são capazes. Jovens com Síndrome de Down enxergam no emprego a oportunidade de agirem com mais autonomia e independência, mesmo quando horário do expediente chegou ao fim. O problema é que o número de vagas  para pessoas com deficiência ainda é menor do que o de profissionais aptos a trabalhar.

Na escola Juliano Varela, por exemplo, 15 alunos estão trabalhando e outros 10 estão preparados, mas, para estes últimos não há mais vagas disponíveis.“Muitos empresários não empregam pessoas com síndrome de Down por desconhecimento. Isto porque pensam ser necessário abrir outro setor na empresa ou ainda contratar mais um funcionário para atuar como espécie “tutor”, o que não ocorre”, explica a assistente social Janaína Batista dos Santos.

Outra questão apontada por ela é a carga horária. Como eles precisam estudar no período vespertino, só podem trabalhar 4 horas por dia. “Ainda tem muito preconceito muita exclusão. Acham que eles vão ser agressivos, mas eles são carismáticos”. Janaína explica que eles exercem funções administrativas e se sobressaem no quesito atendimento ao público.

Leonis Guimarães, de 22 anos, mais conhecido como Léo, é um dos que ressalta habilidade  que tem para recepcionar o público do local onde ele trabalha, na Assembleia Legislativa em Campo Grande. Ele brinca com a quantidade de vezes que precisa falar bom dia ao longo da jornada de trabalho e detalhe outras atividades que exerce como receber encomendas e distribuir o jornal do dia entre as salas.

Questionado sobre como surgiu a ideia de trabalhar, ele conta que tava fazendo o curso na escola quando a mãe o orientou. “Meu sonho era trabalhar! Com meu dinheiro, escolho a roupa, calça, camiseta, terno. Vou trabalhar bem vestido”, ressalta.

Trabalhar também era o sonho para Miguel Ângelo, de 29 anos, até que surgiu uma vaga na Empresa de Saneamento Básico de Mato Grosso do Sul ( Sanesul). Ele aceitou, mas, depois de um tempo acabou pedindo demissão porque não tinha carteira assinada e atuava mediante contrato.

A empresa não aceitou  o pedido de desligamento de Miguel tão facilmente e ele foi convidado a retornar. Desta vez, com carteira assinada. Com o salário que recebe, Miguel auxilia no pagamento das contas da casa. “Pago internet, compro roupa, calçado, terno, gel para cabelo e perfume para ir para o trabalho”, revela vaidoso. “Tenho orgulho de mim mesmo”.

Os relatos de Bruno Serpa, Edilson Rodrigues, Cirilo Lino, Higor César, Ísis Larissa, Kelly Cristina, Rhuanna Said, Luara Rodrigues e Stephanie Massuda são semelhantes. Todos afirmam que trabalhar sempre foi um sonho e exibem orgulhosos o que celulares ou roupas compradas com os salários.

Kelly é quem lamenta a falta de vagas para outros colegas enquanto Stephanie reclama dos dias em que há pouco movimento na loja onde está empregada, restando pouco trabalho para ela.

CARISMA

Stephanie é auxiliar administrativo na Associação Adventista, empresa que ainda não empregava pessoas com deficiência até conhecer estes jovens. “Eu levei eles lá para uma entrevista e o diretor ficou encantado”, conta a assistente social.

Ela explica que antes de serem empregados, os alunos fazem curso de informática, noções administrativas e higiene pessoal. Quando já estão trabalhando eles continuam sendo acompanhados pela escola e são avaliados mensalmente em relação ao trabalho que estão exercendo e ao comportamento também.

Janaína lamenta que, em alguns casos, o preconceito começa na família, quando os parentes não acreditam que a criança tem potencial e não estimulam o desenvolvimento delas . “Não buscam fonoaudiólogo, fisioterapeuta  que são profissionais que eles necessitam”.

Segundo ela, crianças que têm esse tipo de tratamento apresentam desenvolvimento superior quando se tornam adultas e vão para o mercado de trabalho.

FAMÍLIA

O perito criminal Antônio César Moreira de Oliveira, 51, é pai da Ana Júlia, 10, e da pequena Maria Clara, 3, diagnosticada com síndrome de Down ao nascer. A esposa dele, Selma Regina, 42, fez o pré-natal, mesmo assim a síndrome não foi identificada.

“Assim que vi a Maria  percebi que ela era diferente, mas faltou orientação melhor nesse sentido. Buscamos informações sozinhos na internet e depois nosso pediatra que é uma pessoa sensível deu outras dicas”, lembra Antônio.

Antônio sabe que, quanto mais cedo tem início o acompanhamento da criança, maiores são as chances de ela se desenvolver normalmente. “Existe a questão da própria família parar de fazer alguma coisa e se dedicar à criança”, diz, se referindo à escolha feita por Selma em fechar o estabelecimento de qual era proprietária para ter mais tempo com Maria.

Ele conta que a filha ainda não fala. “Quanto mais cedo começa esse acompanhamento,  evita esse atraso. A criança começa a se socializar melhor, a se movimentar melhor. Tem que ter essa atenção exclusiva”, diz Antônio, explicando que os bebês diagnosticados com síndrome de Down podem ter doenças cardíacas ou na tireoide, por exemplo.

Maria estuda na Juliano Varela e é muito sociável. O convívio com a irmã mais velha também ajuda nesse quesito. “A socialização com outras crianças que não são especiais ajuda muito a melhorar o comportamento. As crianças com síndrome de Down são muito carinhosas”, ressalta.

Sobre a inclusão no mercado de trabalho, ele opina ser bom “para a empresa, para a família e, principalmente, para as pessoas diagnosticadas com a síndrome”.

Fonte: Correio do Estado ( Campo Grande/MT)