Ingrid Vogl
A Gestão Democrática é baseada na coordenação e integração de ações e atitudes que propõem a participação da comunidade escolar (professores, alunos, pais, direção, equipe pedagógica e demais funcionários), que é considerada sujeito ativo em todo o processo da gestão, participando de todas as decisões da escola. Neste sentido é necessário que cada um destes sujeitos tenha clareza e conhecimento de seu papel como participante da comunidade escolar ou das instâncias colegiadas.
E é justamente por meio dos espaços colegiados que existem nas escolas que se faz a gestão democrática. Isto é o que defende Ismael Bravo, assessor e consultor em políticas de educação e sistemas educativos no setor público e privado. O professor ainda ressalta a importância da formação dos gestores escolares para atuarem frente aos espaços colegiados e a capacitação dos integrantes de cada organização composta por representantes da comunidade escolar, para garantir a efetiva qualidade do trabalho nesses ambientes democráticos. Confira a seguir a entrevista exclusiva concedida ao Compromisso Campinas pela Educação (CCE).
CCE- O que é gestão democrática e quem deve encabeçar esse processo dentro da escola?
Ismael Bravo- Temos primeiro que entender o que é gestão e o que é democracia. Uma é explicada por uma ciência social aplicada, que é gestão, e a outra é uma questão de ordem filosófica e ideológica. Quando junto as duas, é como se estabelecesse essa sinergia, porque posso ter pessoas que podem gostar mais de gestão e outras mais focadas na participação. É preciso que o diretor tenha qualificação para encabeçar o processo de gestão democrática dentro da escola.
CCE- Como devem funcionar os espaços democráticos dentro da escola?
Ismael Bravo- É preciso entender a escola como organização, fazendo com que o espaço físico aconteça. Neste sentido, a escola já tem suas organizações institucionalizadas que são a Associação de Pais e Mestres (APM) focada na parte financeira da escola ligada à gestão e infraestrutura; o Conselho de Escola ligado à própria gestão; Conselho de Classe com a parte pedagógica e os Grêmios Estudantis com os alunos se envolvendo no dia a dia escolar. Com tudo isso funcionando com qualidade é possível discutir democracia na escola. A pergunta que tem que ser feita é se esses espaços colegiados estão funcionando com o objetivo para os quais foram criados, ou se apenas se tem uma reprodução anual do mesmo sistema, com os mesmos atores. Se tudo isso estiver funcionando plena e efetivamente, isso é democracia.
CCE- Quais outros desafios para que a efetiva gestão democrática, por meio dos colegiados, aconteça nas escolas?
Ismael Bravo- Primeiramente, não precisa ter idade para começar a trabalhar a democracia na escola. Isso inclusive pode ser iniciado com crianças da educação infantil, com 4, 5 anos de idade. E isso começa nas relações e construções coletivas.
Também é preciso que a escola convide a comunidade para ajudá-la e para isso é preciso que a gestão tenha um projeto para trazer a comunidade para a escola. É preciso também pensar na capacitação da comunidade interna e externa da escola para atuar dentro dos espaços democráticos. Envolver as redes de ensino é essencial neste processo.
CCE- Quais os impactos e benefícios de uma efetiva gestão democrática na escola?
Ismael Bravo- Os impactos podem ser positivos ou negativos, dependendo de como a gestão democrática acontece na escola. Ele é positivo quando os espaços coletivos são aplicados corretamente, no sentido de terem autonomia e responsabilidade. Esse exercício leva o cidadão e futuro adulto a ter uma base para olhar a sociedade e entender o que vem a ser democracia, para entender, por exemplo, esse cenário que vivemos hoje no Brasil. Os espaços colegiados também devem ter regras definidas, decididas em grupo e incluídas pelo regimento interno de cada um dos espaços democráticos, para que a partir disso, o trabalho de cada grupo aconteça.
CCE- Como você enxerga o atual panorama da gestão democrática na escola?
Ismael Bravo- Não se institui democracia por lei. A partir do momento que a comunidade escolar define como vai trabalhar, ela estabelece regras para poder harmonizar tudo que está acontecendo. O panorama é confuso, já que a escola espera que a Secretaria de Educação ou o Plano de Educação faça a gestão democrática acontecer. Mas ninguém reflete sobre os espaços democráticos que já são instituídos nas escolas, e que se eles funcionarem bem, a gestão democrática já estará sendo praticada.
CCE- Quais os principais desafios para a efetivação da gestão democrática nas escolas?
Ismael Bravo- Criação e qualificação dos espaços de colegiado. O que engessa lideranças é ficar na corda bamba se toma ou não a decisão. É preciso tomar decisões independentemente de lei. Porque os espaços democráticos já estão no regimento da escola. Mas é preciso estar preparado para fazer a gestão colegiada na escola. Não é possível, por exemplo, um Conselho de Classe permitir que um aluno passe de ano sem condições. E isso se faz aos montes. Isso gera prematuramente – por conta do conselho democrático da escola – futuros alunos de Educação de Jovens e Adultos (EJA), porque o aluno que é empurrado ano a ano carrega dificuldades que impactam lá no ensino médio e na graduação.
CCE- A gestão democrática na escola prevê a escolha do diretor pela comunidade escolar. Este é o caminho mais adequado para a definição do gestor?
Ismael Bravo- A pergunta que se tem é de ordem jurídica. A regulamentação disso deve ser na lei trabalhista. Não está no plano de carreira essa questão da escolha do diretor. As assessorias jurídicas dos municípios estão aconselhando as secretarias de educação a não entrar nesta seara trabalhista. Para que a escolha do diretor seja feita por meio de votação da comunidade, é preciso mudar o plano de carreira e, além disso, não é possível transferir uma responsabilidade de quem administra a educação para a comunidade. Contribuir nos espaços democráticos é uma coisa, avaliar tecnicamente é outra.
CCE- Algumas redes de ensino estimulam algumas questões relacionadas à gestão democrática, como a criação e o fortalecimento de grêmios estudantis. Estes incentivos são suficientes? Por que?
Ismael Bravo- Só a criação do grêmio não é suficiente. É preciso a atuação dos pais, da comunidade escolar como um todo. O professor, por exemplo, só tem sucesso quando trabalha de forma coletiva dentro das salas para depois trabalhar na individualidade. E para se trabalhar no coletivo é necessário todo um arsenal metodológico que envolve disposição de mobiliário e um ambiente propício. Não é possível esperar a escola ideal para fazer isso. É preciso fazer o ambiente propício com o que se tem, sem esperar pela escola estruturalmente ideal.
Além disso, é preciso pensar a gestão como um todo, não só a gestão democrática, mas também a gestão de pessoas, a capacitação para o século 21, e definir o conceito de escola que se vai trabalhar, se é uma escola transformadora. A atividade meio é uma escola educadora, onde as relações são parte desse processo de educação.