(Por Ariany Ferraz)
Pallets são materiais que inspiram. E quando mais do que ícones decorativos se tornam ferramentas para a transformação de vidas? É assim que a organização ‘Projeto Há Esperança’ está promovendo a iniciativa ‘Marcenaria de Rua’, que irá capacitar gratuitamente diversas pessoas, principalmente as que estão em situação de rua, na região do Oziel em Campinas/SP. Utilizando materiais de baixo custo e que podem ser recicláveis, a oficina oportuniza uma profissão e a (re)inserção no mercado de trabalho para pessoas em situação de vulnerabilidade social.
Após analisar a realidade da região, onde o trabalho e a geração de renda foram evidenciados como necessidades latentes, o projeto buscou atender a demanda com uma atividade que pudesse acolher pessoas de diversos perfis. “Trabalhamos com pessoas em condição de vulnerabilidade social muito grande e que não têm renda, quando têm são bolsas ou pequenos auxílios, além da falta de profissionalização. A profissão que oportunizamos dá uma chance deles trabalharem com um produto barato, que muitas vezes dispensa a compra da matéria prima, podem reciclar pallets, achados como descarte”, explicou o coordenador geral da instituição, Robson Teixeira.
“Aqui é uma escola que realmente ensina. Eles conseguem se inserir no mercado de trabalho tendo uma noção muito boa de marcenaria”, observou o coordenador. Com 15 alunos atualmente, o curso gratuito possui duração de 6 meses e ensina marcenaria básica, desde os conhecimentos sobre medidas, madeira, maquinários, projetos, até a fabricação de móveis. A participação é aberta a todos os interessados que tenham a partir de 18 anos, sem limite de idade. Está aberta a moradores do Oziel e entorno, como os bairros Jardim Monte Cristo, Jardim do Lago II e Gleba B.
Duas vezes por semana o professor Jucivan Santana orienta as duas turmas em curso, durante a manhã das 8h às 12h e à tarde, das 13h às 17h. “Meu propósito é mudar vidas, para que as pessoas saibam fazer um banco, uma cadeira, um armário, uma mesa… para que possam ter uma renda. E mais do que uma profissão, é também uma terapia. Marcenaria para quem gosta é uma arte!”, revelou o professor, marceneiro há dois anos. Entusiasta, Jucivan conta que a experiência é gratificante. “Ao perceber os alunos se descobrindo na ocupação eu busco incentivá-los sempre”, disse.
“Gostei da oportunidade, ótimo para quem não tem emprego”, falou Adriana Cristina Ferreira, 28 anos, moradora do bairro. “Tô amando e pode ser uma oportunidade única”, contou Solange Santos, 31 anos, também residente na comunidade. Com muitas expectativas, ela já tem compartilhado nas redes sociais os móveis feitos em equipe. Solange pretende encontrar uma forma de obter rendimentos, além de produzir itens para a própria casa.
“O curso está sendo bom porque eu tô em situação de rua e tô ocupando minha mente, meu tempo, fora da rua. É bem valorizante e está sendo muito importante pra mim”, relatou Flávio Alexandre, 38 anos. Em processo de adaptação, Flávio que já atuou como cozinheiro e pizzaiolo, agora avalia a oportunidade de mudar de profissão, pois conta que está gostando bastante do curso. Já Luiz Roberto Figueiredo, 50 anos, também em situação de rua, mostra com orgulho os móveis feitos em equipe. “Muito bom aprender! Quero trabalhar nessa área e a ideia é arrumar um emprego!”, comentou.
A mudança de vida pretendida impacta desde a realização pessoal e profissional, quanto nas famílias e comunidade do beneficiado. Além de um caminho de inclusão social, a marcenaria busca promover o resgate de direitos, qualidade de vida, auto-estima e valorização do indivíduo, estimulando a autonomia.
Todo material produzido nas aulas beneficiará os próprios alunos. Com a venda dos móveis será gerado um recurso que poderá ser utilizado por eles. “Pretendemos locar uma casa para eles, por exemplo, e com aquilo que ele mesmos construíram vão conseguir se ressocializar. Isso fortalece vínculos e tira-os da linha de pobreza. Através da nova profissão, vão conseguir sobreviver e não voltar para rua”, avalia. Ele conta que já existem várias encomendas de móveis.
Empreendedorismo comunitário
A instituição ‘Há Esperança’, que já atuava com diversas modalidades de oficinas envolvendo empreendedorismo, buscou potencializar a ideia já existente tirando-a do papel para realizar um sonho. O projeto ‘Marcenaria de Rua’ foi um dos 11 escolhidos na chamada do projeto Empreendedorismo de Base Comunitária (EBC) lançado em 2018 pelo Programa Desenvolvimento Local da Fundação Feac.
Com a proposta de viabilizar projetos de grupos engajados que buscam contribuir para o bem-estar de suas comunidades, o EBC selecionou ideias por meio de uma chamada de projetos.“O projeto tem por objetivo contribuir com grupos e organizações de base comunitária para que estes ampliem a qualidade de vida nos territórios. Os temas são diversos e as ideias podem mudar as realidades das comunidades”, destacou Lincoln Moreira, responsável pelo projeto e gerente do Departamento de Assistência Social (DAS) na Feac.
“Acreditando que ideias podem ser transformadoras, a iniciativa contribui para melhorias no trabalho e renda, educação, inclusão e qualidade de vida. Apoiamos soluções contextuais que atendem prioridades locais e com potencial para transformar realidades, fortalecendo o tecido coletivo e territorial”, ponderou Viviane Nale, líder do Programa Desenvolvimento Local.
Projeto Há Esperança
Organização da sociedade civil, sem fins lucrativos, com foco no desenvolvimento integral de moradores de rua e comunidades carentes. Investe na construção e restauração de vínculos familiares, prevenção ao uso de drogas e reintegração de pessoas em situação de rua.
Tem a preocupação de assegurar espaços socioeducativos, inclusivos e sustentáveis.
Endereço: Rua Cabo Rúbens Zimmermann, 186, Pq. Oziel – Campinas- SP
Telefones: (19) 99762-4233 / 97420-8242 / 98286-7095
Confira a lista de projetos/organizações que integram o EBC 2018/2019:
– Projeto Empreendedorismo no Sírius – Sociedade Cultural Científica e Ecológica Trilha Verde.
– Projeto Esquina Cultural – União Cristã Feminina
– Projeto Entre Linhas e Trilhos da Memória –CPTI
– Projeto Feira do Grande Village- AMIC – Amigos Da Criança C.E FÉ E AMOR VILLAGE
– Marcenaria de Rua- Projeto Há Esperança
– Ritmo, harmonia e cidadania- Sirius MISC/ Instituto Elos
– Maria Retalho- Comec
– Projeto Mais Pra Você- AMAR (Associação de moradores da Vila Abaeté e Região)
– Projeto do campo à mesa- Associação Cornélia Vlieg
– Projeto Madrepérola- Enactus Unicamp
– Casa Hacker – Explorando, Construindo e Participando do Mundo Digital – Instituto Sociocultural Voz Ativa