(Por Ingrid Vogl)
Disciplinar o uso do dinheiro público, evitar possíveis fraudes, ampliar o acesso à deficientes auditivos e corrigir distorções do uso dos resultados. Estes são alguns dos objetivos que as mudanças no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2017 pretendem alcançar. As inscrições para a edição do exame deste ano ocorreram de 8 a 19 de maio. Diferentemente do que vinha acontecendo desde 2009, com a realização do Enem em um único fim de semana (sábado e domingo), a prova passa a ocorrer em dois domingos consecutivos, 5 e 12 de novembro.
Segundo Maria Inês Fini, presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), em 2009 o Enem sofreu uma profunda transformação que modificou o projeto original a partir do qual ele foi estruturado. Desde aquele ano, a avaliação passou a ser o acesso obrigatório às faculdades públicas federais e muitas outras unidades particulares que usam o resultado do exame na composição de seu processo de admissão.
Além disso, foi agregado ao Enem a possibilidade de ser o exame oferecido para a certificação do ensino médio, o que é totalmente inadequado, de acordo com a presidente. “ O Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (Encceja) foi criado para este fim e permite aos sistemas de ensino, tanto da escola fundamental quanto da escola de ensino médio, atribuir uma certificação de nível de ensino a partir do resultado deste exame”, afirmou.
Portanto, a partir deste ano o Enem deixará de certificar o ensino médio. Tanto a certificação do ensino fundamental quanto para o ensino médio será feita exclusivamente pelo Encceja, já no mês de setembro.
Maria Inês também ressaltou a distorção do uso dos resultados do Enem, já que muitas escolas escolhiam quais alunos fariam a prova, ou então, minimamente 10 alunos faziam a prova para assim a escola conseguir o boletim de resultados da avaliação. “Isso é totalmente errado e inadequado, porque para avaliar a escola, outros fatores que não só o de desempenho são necessários e precisam ser considerados”. Para que fosse tirada essa função do Enem, o Sistema de Avaliação de Educação Básica (Saeb) foi ampliado e a partir de agora, não só os 5º e 9º anos têm a obrigatoriedade de fazer as provas, mas também o ensino médio, que até então não era censitário e fazia uma avaliação por amostragem. “Para se ter acesso ao boletim de resultados as escolas particulares deverão pagar uma taxa simbólica para fazer o Saeb”, disse.
O Saeb desse ano será aplicado no segundo semestre, porém antes do Enem, e também deve funcionar como um simulado de preparação para o exame aplicado aos 3º anos do ensino médio.
Consulta pública
Entre os dias 18 de janeiro e 17 de fevereiro de 2017, o Ministério da Educação (MEC) realizou uma consulta pública com a participação de mais de 660 mil pessoas. A pesquisa incluía perguntas sobre assuntos como os dias de realização do exame e o formato da aplicação.
De acordo com o MEC, 63,7% dos participantes votaram pela realização do Enem em dois dias, contra 36,3% que preferiram a aplicação das provas em uma data só .
Além disso, dentro da possibilidade de aplicação do exame em dois dias, 42,3% manifestaram preferência pela aplicação do Enem em dois domingos seguidos, enquanto 34,1% votaram pela realização das provas em um só fim de semana e outros 23,6% optaram por domingo e segunda-feira.
Na mesma pesquisa, a maioria dos participantes ainda manifestou interesse pela continuação da realização das provas em papel: apenas 29,9% votaram pela aplicação por computador.
Segundo Maria Inês, do ponto de vista operacional, muitas alterações foram definidas a partir da consulta pública. “Além de indicarem que a realização do exame em dois dias consecutivos era muito cansativa, uma característica dos Enem anteriores, incomodava muito a gestão atual do Ministério, porque tínhamos que obedecer a uma reclusão dos jovens e adultos que professam leis que guardam o sábado (sabatistas), já que estas pessoas ficavam confinadas em uma sala com os demais candidatos, mas só realizavam a prova após o pôr do sol. Isso foi corrigido com a aplicação em dois domingos “, explicou.
O Enem também passa a oferecer a partir deste ano a prova em vídeo de libras para deficientes auditivos. Para isso, foram criadas salas especiais, ao lado das demais, devidamente preparadas com tratamento acústico que contarão com profissionais especializados para o acompanhamento.
Segurança
Com a parceria e apoio da Polícia Federal, todas as provas serão identificadas nominalmente, o que deve diminuir possíveis fraudes na aplicação do exame. “As provas não serão mais identificadas pela cor, mas sim com o nome e o sobrenome do aluno, e a folha de resposta estará dentro do caderno de provas para que seja picotada. Isso aumentará muito a segurança e evitará fraudes”, disse Maria Inês.
Com relação à isenção da taxa de inscrição, que até então era realizada via autodeclaração de baixa renda, ela passa a ter os cadastros no CadÚnico, um banco de dados do governo federal que é analisado para conferência da veracidade das informações. Outra opção para fazer o pedido de gratuidade da taxa é apresentar o nome da escola pública para que seja verificado se o aluno é concluinte do ensino médio, cujas família não tenham renda superior a 3 salários mínimos ou ainda por lei, quando na família a renda por pessoa é igual ou menor a um salário mínimo e o candidato tenha cursado o ensino médio em escola pública ou como bolsista integral em escola privada.
Outra medida tomada é que a partir deste ano, o aluno que requerer a isenção de taxa, for contemplado e não comparecer à prova, não terá mais direito à gratuidade no ano seguinte. “Em 2016 tivemos 1,3milhão candidatos que fizeram uso do recurso autodeclaratório e não foram fazer a prova. Isso tudo significa um gasto enorme para o governo. Com estas medidas de segurança, nosso objetivo é justamente preservar e disciplinar mais o dinheiro público”, afirmou Maria Inês.
Os candidatos que solicitam uma hora a mais para a realização do exame, alegando deficiências específicas, terão que acrescentar laudo médico no ato da inscrição, que poderá ser deferido ou não. Até o ano passado, o laudo era entregue na hora da prova. Esta medida foi tomada pelo Inep para que seja comprovada a real necessidade dos candidatos, de acordo com Maria Inês, que garante às pessoas com deficiência atenção adequada para a realização da prova.
A presidente do Inep avalia as mudanças do Enem 2017 como bem aceitas pelos candidatos e toda a sociedade. “Eu acredito que o aprimoramento do exame traz mais conforto e tranquilidade para quem vai fazê-lo este ano. No mais, o Enem deste ano tem as mesmas características do ano passado. Estamos aguardando com muita boa expectativa a implantação da reforma do ensino médio e também a Base Nacional Comum Curricular, que vai dar um contorno diferenciado para o Enem, provavelmente a partir de 2019”, apostou.