O serviço de acolhimento em família acolhedora de Campinas foi criado em 1997 como alternativa ao acolhimento institucional, em abrigos e casas lares, para crianças e adolescentes até que retornem a sua famílias biológicas de origem ou extensa, ou sejam encaminhados para adoção por famílias substitutas. Para se ter uma ideia do seu pioneirismo, o acolhimento familiar só foi instituído pelo governo federal em 2009, quando a Lei 12.010 acrescentou ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) a previsão desse serviço, que deveria, inclusive, ser preferencial. Mais de 20 anos depois, no entanto, o acolhimento familiar ainda enfrenta barreiras para crescer em Campinas.
No município, o acolhimento familiar é realizado pelo poder público, com o Serviço de Acolhimento e Proteção Especial à Criança e ao Adolescente (Sapeca), que conta com 17 famílias acolhedoras habilitadas e prontas para acolher, e pelo ConViver, executado pela Guardinha – que trabalha na defesa de direitos de crianças e adolescentes –, que conta com 20 famílias habilitadas e prontas para acolher.
“Mesmo com o pioneirismo de Campinas no acolhimento familiar, o número de famílias habilitadas ainda é baixo e insuficiente para o porte do município e para o número de crianças em acolhimento institucional, que poderiam estar com famílias acolhedoras”, constata Ana Lídia Manzoni Puccini, líder do Programa Acolhimento Afetivo, da Fundação FEAC.
Em maio de 2021, havia 294 crianças e adolescentes nos serviços de acolhimento do município, dos quais apenas 24 estavam em famílias acolhedoras – todas elas com idades entre 0 e 6 anos, público prioritário para o acolhimento familiar em Campinas. Na cidade, o serviço está distante, portanto, de ocupar o espaço preferencial que lhe destina a lei. No entanto, a proporção de 8,2% de acolhimento familiar é o dobro da taxa nacional, que é de 4%, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça.
Barreiras
O principal gargalo para o acolhimento familiar crescer em Campinas está justamente na ausência de famílias que aceitem participar. O Sapeca, por exemplo, tem hoje 17 habilitadas, mas poderia operar com até 25.
“As pessoas têm receio de acolher em casa, se afeiçoar e a criança ir embora. O acolhimento precisa de amor, de criação de vínculo, mas sabendo desde o começo que está cuidando temporariamente para entregar para outra família. É um temor natural”, constata Maria José Geremias, coordenadora da proteção social especial de alta complexidade para criança, adolescente, jovem e mulher da Secretaria Municipal de Assistência Social, Pessoa com Deficiência e Direitos Humanos.
“O acolhimento familiar não é adoção: as crianças permanecem na família de forma temporária. A intenção de adotar pode ser um fator determinante para que essa família seja excluída do processo de habilitação”, diz Ana Lídia.
Ainda que passem pelo primeiro crivo, muitas famílias desistem durante o processo de formação, que é obrigatório. Essa etapa demora em média de dois a três meses, dependendo da disponibilidade de tempo dos interessados. Na formação, são realizados encontros que tratam de temas como o ECA, as fases do desenvolvimento infantil e as consequências que situações de violência causam nas crianças.
E mesmo quando a família é habilitada para o serviço, não há garantia de que vá sempre participar, pois se trata, na verdade, de uma ação voluntária. O processo de cuidado e depois de despedida causa para algumas famílias uma grande carga emocional, e entre um e outro acolhimento, precisam de um tempo maior. As famílias passam, inclusive, por acompanhamento com psicólogos e assistentes sociais dos serviços, que lhes dão apoio e suporte emocional.
“Os brasileiros são muito afetuosos e o momento do tchau é muito difícil. Há famílias que fazem um primeiro acolhimento e saem. Outras, decidem dar um tempo antes de acolher outra criança”, ressalta Erika Ferraz Ribeiro, coordenadora do ConViver.
Divulgação
A FEAC é parceira do serviço de acolhimento familiar de Campinas desde 2005. A criação do Programa Acolhimento Afetivo é uma decorrência do seu comprometimento com tema.
Em 2019, a Fundação realizou uma ampla campanha de divulgação do serviço em Campinas, para atrair a atenção da sociedade. Foi realizada uma série de vídeos com famílias acolhedoras falando sobre sua experiência, e produzidos também vários materiais de campanha para rádio. “Fechamos parcerias com mais de 200 comércios que garantiram descontos aos participantes do serviço”, recorda-se Ana Lídia, da FEAC.
“A divulgação em massa e contínua é muito importante para chamar a atenção aos serviços de acolhimento familiar, ainda mais considerando que, mesmo com muita gente interessada, poucas acabam participando no final. É preciso volume”, diz Erika.
Já Maria José ressalta que a comunicação é importante para “desmistificar o temor de não acolher por medo de se vincular”, e aponta a importância de atrair diferentes estruturas familiares, que aceitem acolher diferentes perfis de crianças e adolescentes.
“O serviços de acolhimento trabalham com diferentes configurações de famílias, sem discriminação de raça, cor, religião, orientação sexual ou estado civil. Também precisamos de pessoas que aceitem mais de uma criança e acolham irmãos, ou que queiram receber adolescentes”, finaliza Maria José.
Se você tiver interesse em saber mais sobre como se tornar uma família acolhedora, entre em contato com o Sapeca, pelos telefones (19) 3256-6067/6335, ou pelo e-mail [email protected]. Você também pode procurar o ConViver pelo telefone (19) 99368-2008 ou pelo e-mail [email protected].
Por Frederico Kling
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