(Por Laura Gonçalves Sucena)
Bernardo nasceu Larissa Nascimento e quer ser respeitado por isso. Transgênero, o menino, que estuda no 1º ano do ensino médio da Escola Estadual Messias Gonçalves Teixeira, é um dos participantes do projeto “Jovens Mobilizadores/as dos Direitos Sexuais e Reprodutivos”. O objetivo é capacitar jovens de entidades de assistência social e escolas públicas de Campinas/SP para atuarem como multiplicadores na realização de ações de educação e informação sobre temas de saúde sexual e direito reprodutivo.
Constituído por meio de uma parceria entre Fundação FEAC e Reprolatina, o projeto visa contribuir na diminuição de vulnerabilidades de jovens, em especial da gravidez não planejada, de doenças sexualmente transmissíveis (DST/HIV-Aids), violência e bullying.
Com diversos outros parceiros, a iniciativa contará com ações realizadas nas regiões Norte, Sul e Leste de Campinas, de acordo com a divisão da Política de Assistência Social do município. Cada local conta com a parceria de uma escola estadual, uma Organização da Sociedade Civil (OSC) parceira da FEAC e uma Unidade Básica de Saúde(UBS) que receberão as ações do projeto.
Na região Norte, a parceria foi realizada com o CPTI – Centro Promocional Tia Ileide, a Escola Estadual Professor Messias Gonçalves Teixeira e o Centro de Saúde Vila Padre Anchieta. Na Sudoeste, os parceiros são o CEPROMM – Centro de Promoção para um Mundo Melhor, a Escola Estadual Maria de Lourdes Campos Freire Marques e o Centro de Saúde Itatinga. Já na Sul, os escolhidos foram a SETA – Sociedade Educativa de Trabalho e Assistência, a Escola Estadual Moacyr Santos de Campos e o Centro de Saúde Parque São Quirino.
De acordo com o consultor da Reprolatina e coordenador do projeto, Rodrigo Correia, a intenção é que esses parceiros atuem em seus territórios e promovam a defesa dos direitos sexuais e reprodutivos e das políticas de juventude na área da saúde e da educação integral em sexualidade.
“Falar de prevenção dos jovens a respeito de suas vulnerabilidades é de extrema importância e essa parceria, que visa a promoção e defesa desses direitos, é necessária para trabalhar a questão da sexualidade, a valorização do corpo, o cuidado com a saúde, a discussão pela igualdade de gênero. Temos que ficar atentos porque a gravidez na adolescência existe especialmente em regiões de maior vulnerabilidade. Os indicadores mostram que o mesmo acontece com outras epidemias que estão aumentando como a AIDS e a Sífilis. Não basta somente levar informação, o jovem tem que incorporar isso na sua prática e é isso que queremos”, completou o coordenador.
Para o superintendente socioeducativo da FEAC, Leandro Pinheiro, a temática trabalhada pelo projeto tem se tornado cada vez mais relevante. “As questões dos direitos sexuais e reprodutivos têm ficado um pouco a margem das atenções e percebemos algum tipo de retrocesso em alguns indicadores importantes. Quando isso acontece é importante o papel do investimento social privado para complementar os espaços que ficam entre as políticas públicas. Temos certeza que esse trabalho em conjunto com as instituições, UBSs e escolas será muito produtivo”, enfatizou.
Capacitação
Entre agosto e dezembro, o projeto irá capacitar 72 jovens para atuarem como mobilizadores em temas de saúde sexual e reprodutiva e na promoção e defesa dos direitos sexuais e reprodutivos e das políticas públicas de juventudes na área da saúde e da educação integral em sexualidade.
Durante o projeto, os jovens, de 15 a 29 anos, passam por formação de 32 horas efetivas de curso com profissionais da Reprolatina. O programa contém diferentes módulos integrados entre si sobre os temas de juventude e a saúde sexual e reprodutiva, que permitirá prepará-los para atuarem como mobilizadores. Ao final da capacitação cada jovem receberá um caderno de atividades para servir de apoio e guia na realização das ações previstas.
“Até o final do ano também serão selecionados 20 profissionais das áreas da saúde, da educação, assistência social e das instituições, que estejam dispostos e se comprometam a atuar como referências dos jovens mobilizadores e facilitadores do processo de mudanças necessário para construir uma cultura de prevenção. Nossa ideia é que esses profissionais ainda realizem atividades educativas de prevenção em saúde sexual e reprodutiva em seus respectivos lugares de atuação”, complementou o coordenador.
Primeira Turma
Bernardo Nascimento e sua amiga Vitória Gomes, ambos de 15 anos, se formaram na primeira turma do curso. Na bagagem eles levam muito aprendizado e uma visão diferenciada dos assuntos abordados na capacitação. “Aprendi muita coisa aqui. Não entendia essa coisa de ‘gêneros’ mesmo sendo amiga do Bernardo desde criança. Tirei dúvidas, aprendi sobre métodos contraceptivos, doenças sexualmente transmissíveis e quero mais é levar esse conhecimento para frente”, falou Vitória.
“Essa capacitação também foi muito importante para mim porque eu também tenho dúvidas. Desde que me entendo por gente me identifico como menino, mas acabei sendo menina para as outras pessoas minha infância inteira e agora assumi minha identidade. Eu sei que as pessoas demoram para aceitar, eu mesmo demorei para me aceitar. Então, participar desse curso, saber mais coisas sobre mim mesmo e levar essas informações para outros jovens é fantástico”, garantiu Bernardo.
Para os jovens atendido pelo CPTI, Guilherme Felix, 17 anos, e Carla Souza, 16, a capacitação foi esclarecedora. “Eu até já havia participado de um curso sobre sexualidade no CPTI, mas essa formação foi diferenciada. Aprendi muito, especialmente sobre métodos contraceptivos, e vou ser um multiplicador desse conhecimento”, falou Guilherme. “Também aprendemos que temos que conhecer nosso corpo, temos que nos observar porque isso ajuda inclusive a prevenir doenças. Foi uma experiência muito boa participar”, completou Carla.
O pedagogo do CPTI, Leonardo Lopes Ferreira, acredita que é preciso criar estratégias eficazes de comunicação para atingir os jovens e a perspectiva de se capacitar adolescentes para que eles trabalhem com outros jovens vai ao encontro do que a instituição acredita. “Eles têm dificuldades de discutir essas questões com adultos, então acreditamos muito nesse projeto. A proposta é excelente”, observou.
Segundo o gerente do Departamento de Assistência Social (DAS) da FEAC, Lincoln Moreira, a capacitação tem a intenção de que os jovens aprendam a pensar de uma maneira crítica. “Esperamos que eles tomem decisões e sejam responsáveis pelos seus atos. Queremos jovens com autonomia e engajamento”, ressaltou.
Saiba mais: www.reprolatina.org.br