O Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência, celebrado nesta quarta-feira (21), foi instituído por lei em 2005, mas só dez anos mais tarde, em julho de 2015, seria promulgada a Lei Brasileira de Inclusão (LBI), que representou um marco na garantia de direitos para pessoas com deficiência. 

A LBI tem como base a Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência da ONU e beneficia atualmente cerca de 17,5 milhões de brasileiros com algum tipo de deficiência, segundo levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2019. Também conhecido como Estatuto da Pessoa com Deficiência, o texto aborda a acessibilidade e inclusão na saúde, educação, tecnologia, mercado de trabalho, assistência social, transporte, entre outras áreas.  

Também trata de discriminação, atendimento prioritário, direito à reabilitação e acessibilidade; estabelece, entre outras garantias, que pessoas com deficiência têm autorização de saque do Fundo de Garantia de Tempo de Serviço (FGTS) para aquisição de próteses e órteses; e enumera as principais barreiras que ainda dificultam a vida das pessoas com deficiência no Brasil. Saiba mais sobre o que é assegurado pela lei em publicação comentada da FEAC disponibilizada neste link.

Um olhar integral ao serviço de reabilitação 

“É necessário que o tema inclusão esteja sempre em pauta, para que a sociedade, enfim, compreenda que não se trata de um favor ou uma opção, mas sim de um direito estabelecido. E que as pessoas com deficiência se apropriem desse fato e o reivindique”, afirma Viviane Machado, líder do Programa Mobilização para a Autonomia, da Fundação FEAC, que desenvolve diversos projetos nesta área em parceria com organizações da sociedade civil (OSC), em Campinas. (Conheça outros projetos no quadro abaixo) 

Um destes projetos, que está fechando o seu ciclo no próximo mês, é desenvolvido em parceria com o Centro de Reabilitação Boldrini – Rede Lucy Montoro, uma referência em reabilitação de grandes incapacitados no país. Investiu em tecnologia para viabilizar um modelo de atendimento híbrido no período mais restritivo da pandemia e evitar a interrupção do tratamento.  

“O projeto permitiu o desenvolvimento de um olhar integral ao serviço de reabilitação. Esta aprendizagem evidenciou que não há barreiras intransponíveis quando se tem o desejo de cuidar. Foi quando nós entendemos que estar junto não é sinônimo de estar perto”, conta Katia Cappellaro, coordenadora da assistência do Centro Boldrini.

Ela explica que o trabalho de reabilitação contempla todas as necessidades inclusivas do paciente e tem como foco fortalecê-lo, favorecendo o seu protagonismo na compreensão de seus direitos e aceitação de sua nova condição. “Todo o processo de reabilitação mantém o foco em desenvolver o retorno do paciente à sociedade, com o máximo de suas potencialidades e independência possíveis”, diz Katia. 

Neste processo, as barreiras não são poucas. Entenda-se por barreira tudo que constitui entrave ao exercício de seus direitos à acessibilidade, à liberdade de movimento e de expressão, à comunicação, ao acesso à informação, à compreensão e à circulação com segurança.  

Entre as mais prejudiciais estão as chamadas barreiras atitudinais, ou seja, atitudes ou comportamentos preconceituosos, que impeçam a participação social da pessoa com deficiência em igualdade de condições e oportunidades com as demais pessoas, como, por exemplo não aceitar a matrícula de um aluno com deficiência na escola ou a prática do bullying. A Lei Brasileira de Inclusão elenca seis principais barreiras: além da atitudinal, a urbanística, arquitetônica, nos transportes, na tecnologia e na comunicação. 

“O mundo é hostil para minorias. Hoje sei dos meus direitos” 

Pedro Pilz e a filha Alice

Pedro Pilz e a filha Alice: “Sou hoje a minha melhor versão” 

O paulista Pedro Pilz, 35 anos, é analista de sistemas e mora em Paulínia (SP). Há seis anos sofreu um acidente de moto que o deixou paraplégico. Hoje, ele vive sozinho, tem uma filha, Alice, de oito anos, trabalha, se locomove em cadeira de rodas, dirige e conquistou autonomia e independência.  

Como você está hoje? 

Pedro Pilz – O que eu costumo dizer é que eu sou hoje a minha melhor versão. Aquela frase bem clichê. Eu não trocaria tudo que eu passei por nada. Não sinto falta do Pedro que eu era antes. Seis anos de crescimento e aprendizagem muito intensos. A evolução e maturidade que eu ganhei com essa experiência tão traumática eu não troco…eu não sei que pessoa eu seria aos 35 anos sem a cadeira de rodas. 

Como foi o processo de reabilitação?

Pedro Pilz –  A reabilitação foi essencial, primordial. O interessante do trabalho do Boldrini é o fato de ser ambulatorial, ou seja, são três vezes por semana, ao longo de aproximadamente um ano. Você consegue ir amadurecendo as coisas aos poucos, com o tempo. Na parte psicológica, principalmente, é importante você ter este acompanhamento mais longo e duradouro. Demora para a ficha cair. Hoje eu vou para shows, teatro, cinema, festivais. Eu tirei carta, comprei um carro. Hoje eu vivo sozinho. Não dependo absolutamente de ninguém.

A parte de serviço social também é crucial. Porque no serviço social eu aprendi que existem as leis e as obrigações. Foi muito importante entender que o fato de ter hoje uma deficiência não me põe à margem da sociedade. Por exemplo, hoje eu tenho conhecimento para exigir adaptação e adequação nos lugares. E para algumas coisas preciso do amparo das leis. Por isso foi importante conhecê-las, entender que eu tenho direito de brigar para impor meu lugar quando necessário. Porque a sociedade me enxerga como um diferente, como dependente.  

No dia a dia, muitos dos percalços que enfrenta estão associados à falta de acessibilidade dos espaços públicos e privados? 

Pedro Pilz – Sim. O mundo para qualquer minoria é hostil. Falta empatia e conhecimento por parte das pessoas. Eu fui ao Lollapalooza, no camarote. Até hoje me arrependo por não ter tirado foto e registrado o descaso. Ninguém que trabalhava no camarote sabia onde era o banheiro PCD. Depois de muito perguntar eles falaram que não estava em condição de uso, que precisava de limpeza. Eu aguardei 40 minutos para poder usar um banheiro.  

Também perdi um show em um dos palcos por falta de transporte até o local. Isso no Lollapalooza! Foi o lugar onde me senti mais humilhado nestes seis anos. E acessibilidade não é facultativa. É lei. Qualquer lugar aberto ao público precisa ter.  

Outro exemplo gritante de falta de acessibilidade é a unidade do INSS, na avenida Barreto Leme, no centro de Campinas. O acesso do estacionamento para a entrada da agência é por uma calçada estreita que tem um poste no meio. Para poder entrar eu preciso ir pela avenida, que é 24 por 7, qualquer hora que você for lá vai ter um monte de carros passando, sempre movimentada.  

Enfim, isso até tem melhorado. Hoje as pessoas têm tido mais conhecimento e fala-se muito mais de inclusão. Eu mesmo trabalho em uma empresa que se preocupa muito com acessibilidade e inclusão.  

Projetos da FEAC promovem inclusão

Atualmente, o Programa Mobilização pela Autonomia, da Fundação FEAC, apoia mais sete projetos inclusivos em parceria com Organizações da Sociedade Civil (OSC). Conheça:  

Projeto O Cuidado da Intervenção Precoce na Primeira Infância  

Realizado pela Organização da Sociedade Civil (OSC) Associação de Pais e Amigos de Surdos de Campinas (APASCAMP), atende bebês com deficiência auditiva de todo o município de Campinas. 

O objetivo é diminuir os atrasos no desenvolvimento motor, cognitivo e de linguagem de crianças nos primeiros anos de vida.  

Projeto Inter(agindo) com o Mundo 

Realizado pela Organização da Sociedade Civil (OSC) Centro de Apoio e Integração do Surdocego e Múltiplo Deficiente (CAIS) atende pessoas com surdocegueira de todo o município de Campinas. 

O projeto tem como objetivo ampliar as formas de comunicação de pessoas com surdocegueira, para que haja possibilidade de obter maior participação na família e sociedade, minimizando as barreiras atitudinais. 

Site: https://www.caiscampinas.org.br/  

Projeto Hub Inclusivo 

Realizado pela Organização da Sociedade Civil (OSC) SORRI CAMPINAS em parceria com o Centro Síndrome de Down (CESD) com o atendimento de empresas e pessoas com deficiência de todo o município de Campinas. 

O projeto tem como objetivo empresas livres de barreiras, construindo processo e gerando uma cultura inclusiva para a diversidade, tornando os espaços organizacionais mais acessíveis, disseminando boas práticas para que a pessoa com deficiência possa trabalhar com equidade, garantindo sua inclusão social e econômica. 

Site: https://www.hubinclusivo.org/ 

Projeto Reabilitação, Estimulação, Desenvolvimento e Inclusão – REDI 

Realizado pela Organização da Sociedade Civil (OSC) Casa da Criança Paralitica (CCP) atende pessoas com deficiência física (0 a 29 anos) da região sudoeste de Campinas. 

O objetivo geral do projeto é propiciar o processo de reabilitação, estimulação e inclusão a partir de atendimentos e orientações, as impulsionando a serem ativas na sociedade. 

Site: https://www.ccp.org.br/web/programas-projetos 

Projeto Em Construção 

Realizado pela Organização da Sociedade Civil (OSC) Centro Educacional Santi Capriotti (CEI) com atendimento de equipamentos socioassistenciais da região dos distritos de Sousas e Joaquim Egídio e as pessoas com deficiência de todo o município de Campinas. 

O objetivo é diagnosticar, assessorar e capacitar equipamentos socioassistenciais para o atendimento à pessoa com deficiência, disseminando os conceitos do modelo social da deficiência e instrumentalizando-as. Além da produção de dados e indicadores que demonstrem as barreiras existentes e que impedem a efetiva inclusão e o fomento de um novo olhar para a deficiência, consequentemente incluindo os usuários. 

Site: https://ceicampinas.org.br/projeto-em-construcao-espaco-incluir/ 

Projeto ASAS 

Realizado pela Ação Social para Igualdade das Diferenças (ASID), em rede com outras 10 parceiras, atende pessoas com deficiência e suas famílias de todo município de Campinas. 

O objetivo é responder à pergunta: “Quem cuidará do meu filho com deficiência no futuro?”. Trabalhando na elaboração e execução de um plano de vida efetivo e que vá ao encontro dos desejos e necessidades dessas pessoas e suas famílias. 

Projeto Acelera Saúde Auditiva 

Realizado pela Organização da Sociedade Civil (OSC) Associação de Pais e Amigos de Surdos de Campinas (APASCAMP) em parceria com a Secretaria Municipal da Saúde, o projeto atende pessoas com suspeita diagnóstica de deficiência auditiva de todo o município de Campinas. 

O objetivo é oferecer aos pacientes com suspeita diagnóstica de deficiência auditiva o diagnóstico assertivo, seguindo o fluxo adequado, que possibilite sua melhora no desempenho escolar, como também na autonomia social e na comunicação. 

 

Por Natália Rangel

Revista Narrativa Social 20 - Ocupando a cidade

Edição 20 – Ocupando a cidade

Urbanismo social: como criar cidades mais inclusivas e solidárias?
Hub de Cidadania Ativa: projeto da FEAC e parceiros fortalece coletivos e cidadania
• Dia 21 de setembro é o Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência

 

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