Por Jair Resende*
Há 59 anos a Fundação FEAC trabalha em parceria com Organizações da Sociedade Civil (OSC) junto às populações mais vulneráveis de Campinas, com prioridade às crianças e adolescentes. A qualificação das entidades do terceiro setor é sua missão histórica. No princípio, o apoio seguia os moldes da filantropia tradicional, tão marcante no Brasil, que se limitava a doar o recurso para potencializar o trabalho das organizações. No caso de Campinas, esse movimento solidário surgiu no seio da sociedade no início do século XX e deu origem a organizações assistenciais que há décadas contribuem no enfrentamento à pobreza na cidade.
No mundo e por aqui, o modelo filantrópico se modificou e assumiu um papel mais pragmático e preocupado com o alcance e a sustentabilidade de suas iniciativas. Muitas ferramentas e métricas do mundo empresarial foram incorporadas e adaptadas à gestão das ONGs e OSC com o objetivo de aumentar a eficiência e os resultados do trabalho realizado. Sabe-se que o investimento social de empresas ou fundações privadas em uma ou mais causas sociais dará mais frutos se puder ser planejado, monitorado, mensurado e sustentado.
OSC também precisa de apoio em sua gestão interna
Pensando nisso, a FEAC iniciou em 2017 uma transformação em sua forma de atuação, reafirmando o seu compromisso com a qualificação das OSC. Neste modelo, o contrato firmado pela FEAC com as organizações parceiras (são mais de 100 OSC em Campinas) passou a ser feito por meio de projetos estruturados.
A mudança foi paulatina, aprimorada ano a ano, e em 2023 atingiu 100%: todas as OSC parceiras receberam recursos através de projetos, dentro desse novo sistema.
Paralelamente, a FEAC estruturou o seu Núcleo de Inteligência Social, para ter os seus próprios mecanismos de monitoramento e avaliação do impacto destes projetos nos territórios, que é como a maior parte das grandes fundações faz hoje em dia.
Entre os principais projetos e ações executados ao longo do ano, as ações se voltaram, majoritariamente, para o impulsionamento das organizações através do fortalecimento institucional, o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários, na garantia de direitos da infância e adolescência, no protagonismo das juventudes periféricas, na inclusão de pessoas com deficiência, no suporte à empregabilidade e ao empreendedorismo, no enfrentamento às violências contra as populações mais vulneráveis e no combate à fome e insegurança alimentar agravados pela pandemia de COVID.
Em cada temática, os recursos são repassados para os projetos com intencionalidade e resultados definidos propostos por organizações parceiras que estejam em sinergia com as linhas de atuação dos programas da FEAC.
Esse percurso tem sido uma conquista para toda a rede envolvida, mas é preciso equilíbrio e confiança neste relacionamento entre entidades doadoras e organizações executoras. Muitas vezes, no intuito de impulsionar uma transformação social, o investidor não se atenta ao fato de que a OSC executora também precisa de apoio em sua gestão interna.
FEAC investe em formação e concede 15% de overhead
As OSC são as organizações que mais conhecem a problemática social que se deseja superar, assim como a população e os territórios onde é preciso atuar. No entanto, toda essa expertise perde potência quando enfrenta dificuldades de infraestrutura e gestão administrativa, realidade da maioria das OSC.
Por isso, a FEAC acredita que é importante investir na atividade-fim da organização e, também, dar apoio institucional. A FEAC faz isso disponibilizando aos profissionais das OSC processos formativos, com mentorias e cursos de boas práticas de gestão e, também, concedendo um overhead de 15% do valor total de cada projeto contratado – recurso destinado a cobrir custos internos de gestão e manutenção da OSC parceira.
Afinal, organizações fortalecidas e economicamente saudáveis conseguem entregar mais. E se expandirmos esse equilíbrio a todo o ecossistema do investimento social no Brasil também vamos aumentar o número de pessoas beneficiadas, que é o objetivo maior da FEAC.
Casarão FEAV: doação fortalece ecossistema do ISP
Nesse sentido, 2023 ficará na história da FEAC como o ano em que a instituição formalizou um importante ato de doação visando o fortalecimento de uma instituição comunitária congênere em um município vizinho, a FEAV ou Fórum de Entidades Assistenciais de Valinhos.
A doação de um imóvel histórico que pertencia à FEAC para a FEAV é um passo inédito na trajetória da fundação e estratégico para o desenvolvimento social da região metropolitana de Campinas. É um movimento importante e disruptivo que inaugura uma perspectiva futura de mais parcerias e transmissão de conhecimento entre esses atores que atuam na área social para potencializar a redução de desigualdades e pobreza.
A FEAV reúne as organizações de assistência, educação e desenvolvimento local atuantes de Valinhos e foi criada há dez anos, inspirada na FEAC, com o objetivo de aumentar a representatividade das entidades junto a sociedade civil e ao poder público. O novo imóvel, um casarão bem conservado de 800 metros quadrados, em um terreno de seis mil metros quadrados, passou a ser a nova sede da instituição que, até então, funcionava em uma sala cedida pela prefeitura em comodato por cinco anos.
Esta contribuição está alinhada ao objetivo da FEAC que é fortalecer cada vez mais o setor social na região, apoiando iniciativas locais por meio de uma abordagem de longo prazo, e transmitindo todo o conhecimento adquirido nesse percurso a outros parceiros. Isso porque a FEAC, assim como outras instituições do ecossistema do investimento social, precisa atuar de forma mais potente para superar as vulnerabilidades sociais que tanto se agravaram com a pandemia.
Todo o movimento que tem feito nesse sentido permitiu à FEAC dobrar seus investimentos sociais, que passaram de R$ 15 milhões, em 2018, para R$ 30 milhões em 2023. É o que consolida a FEAC como um ativo social de alta relevância na cidade de Campinas, com uma história de efetiva contribuição para a implementação e consolidação de políticas públicas e fortalecimento do tecido social. A entidade chega ao final de 2023 com mais de 120 projetos contratados que contabilizam um investimento próximo a R$ 30 milhões.
Campinas é uma cidade com alto índice de Desenvolvimento Humano (IDH), sendo considerada um polo tecnológico, de inovação e pesquisa, com relevância nacional. Mas que apresenta grandes territórios de vulnerabilidade que contrapõem o status de uma grande cidade. Diante disso, a Fundação FEAC passou por um processo de Teoria da Mudança para executar um trabalho ainda mais assertivo com foco no bem-estar social de forma equitativa com foco em crianças, adolescentes e jovens de territórios vulneráveis.
Diversas ações foram e ainda serão implementadas em parceria com a prefeitura de Campinas, sempre tendo como norte a superação das vulnerabilidades sociais do município. Com toda a força dessa união, a instituição completará 60 anos de história em abril de 2024, e seguirá neste novo ciclo renovando o mantra: olhar para o futuro sem se desconectar do presente e valorizando o caminho que nos trouxe até aqui.
*Jair Resende é superintendente socioeducativo da Fundação FEAC.
Edição 34 – Terceiro setor
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